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22 de Março de 2011 - 16h29

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Transparência ou liberdade? Debate divide PS
Por Liliana Valente

Deputado socialista questionou a pressa na legislação sobre transparência de cargos públicos. Ex-presidente do Tribunal de Contas alertou para a rigidez da legislação. O debate-se segue-se em São Bento

Começa a ouvir-se um burburinho. Os deputados à direita da sala agitam-se sempre que ouvem a investigadora Susana Coroado defender regras mais apertadas para os titulares de cargos públicos. Era uma bolha à espera de rebentar e desta vez, de uma forma rara, explodiu à frente de jornalistas.

O PS deixou a comunicação social presenciar um debate interno sobre os projectos sobre transparência e regime de incompatibilidades e códigos de conduta de políticos e o que se viu foram as chagas e discordâncias dentro do partido. Houve quem questionasse a pressa em legislar nesta matéria, quem acusasse os propositores de cederem ao populismo, quem visse na medida uma limpeza a políticos, um excesso de transparência que roça o voyeurismo e representa um problema para a democracia. No final das contas, o partido admite debater mais as propostas, mas não cede no princípio de ir mais longe do que o que hoje existe.

"Não se pretende, todavia, uma nudez desprotectora da reserva que envolve a execução mais sensível dos interesses públicos, nem uma fuga à moderação ou muito menos uma resposta na linha dos populismos. Mas enganam-se os que, pura e simplesmente, acham que as contribuições e os esforços por mais transparência são excessivos, inúteis e autofágicos." Foi assim que Carlos César, o líder parlamentar, acabou a pôr ordem na bancada, assumindo as despesas da defesa dos projectos.

Se o PS quer manter os diplomas que apresentou, esta defesa era uma inevitabilidade. Isto porque as críticas às propostas não foram brandas. Primeiro foi o deputado Ascenso Simões a perguntar o porquê de se fazer uma legislação "com urgência, a mata-cavalos". Mas o ataque mais cerrado seria protagonizado por Sérgio Sousa Pinto e por Isabel Moreira, com o apoio de um vasto número de deputados.

"Podemos salvar o regime da bandalheira, dos corruptos, dos ladrões e saqueadores da democracia e isso é indispensável à sobrevivência do regime. Mas também temos de salvar o regime dos salvadores do regime. Mário Soares referia-se a esse grupo em especial como os epígonos da democracia, os que vêm do fim e não deixam nada", defendeu Sousa Pinto, pondo em causa aquilo que considera ser o espírito da iniciativa que é o de limpar a diversidade dos políticos, porque ao introduzir regras cada vez mais apertadas esta deixa de ser uma actividade apelativa.

"Que tipo de gente corresponde a uma malha cada vez mais apertada? Qual o limite aceitável? Se não houver, estamos a caminhar para uma classe completamente dissociada da sociedade, uma classe sacerdotal, de vestais - não é no sentido biológico [por causa da fonética da palavra], mas no sentido da actividade clássica e que entregou à causa pública a sua existência. Não faz nada a não ser entregar-se à causa pública e aceita a exposição total", disse debaixo de uma salva de palmas.

Para o deputado, é preciso debater os limites da transparência, não cedendo a um lado nem a outro, mas privilegiando a necessidade de garantir que na política se mantêm "homens livres".

Isabel Moreira seguiu na mesma linha criticando a forma e o conteúdo da proposta. "Pergunto se estes projectos são ou não são uma cedência ao populismo e à demagogia? Do meu ponto de visa, são", defendeu. Para a deputada, os diplomas do partido "assentam na percepção da realidade" e se fosse agora não tinha dúvidas de que votaria contra. "Tem normas que do ponto de visto político são absurdas daquilo que é a dignidade dos deputados. Livremente, o pacote que agora conheço, não tenho dúvidas de que votaria contra", disse.

As posições destes deputados deram voz ao que se sentia ser um desconforto já revelado por alguns socialistas que, de uma forma mais suave, questionaram alguns pontos das propostas, como, por exemplo, o regime de excepção para advogados.

Pedro Delgado Alves, que presidia ao debate e foi o principal defensor dos projectos, tentou serenar o debate e garantiu que a discussão só agora começou. Mas a sala estava em rebuliço e acabou por não se conter: "A proposta não é atentatória da essência do parlamentarismo. Atentatório é não participar no debate, não ouvir os colegas, o que às vezes é chato." O debate segue dentro de momentos... no Parlamento.

liliana.valente@publico.pt

Consensos sim mas não à força


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