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22 de Março de 2011 - 16h29

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Energia
Silêncio de Pinho sobre ligação ao GES indigna socialistas
Por Maria Lopes e Helena Pereira

Perguntas sobre rendimentos, offshores e ligações à EDP e GES de Pinho, enquanto ministro, ficaram sem resposta. O silêncio é "despudoradamente anormal", critica Ana Gomes. "Não me passava pela cabeça" que não explicasse, reagiu João Cravinho

Três horas depois e as perguntas que levaram o PSD a propor a audição de Manuel Pinho na Comissão de Economia e Obras Públicas ficaram sem resposta. "Quando convido alguém para ir ver futebol a minha casa, não o ponho a esfregar o chão", ironizou o antigo ministro socialista, que usou amiúde essa imagem para se justificar porque não respondia a qualquer pergunta que não fosse exclusivamente sobre política de energia - essa fora a sua condição para aceder a ir ao Parlamento. Perante a insistência do PSD, Pinho leu uma declaração que trazia escrita. "Disse que não aceitaria responder a outros factos concretos que estão ser alvo de investigação judiciária e que têm que ver com o meu relacionamento com o Grupo Espírito Santo. Factos com os quais nunca fui confrontado. Aliás, nem sequer sou arguido nesse processo."

O silêncio de Manuel Pinho acabou por chocar vários socialistas - mas nenhum estava na sala da comissão. Porque da meia dúzia que por ali passaram, apenas Luís Moreira Testa questionou o antigo ministro exclusivamente sobre como baixar o preço da energia no consumidor e o defendeu das investidas do PSD, Bloco, CDS e PCP. O deputado coordenador do PS na comissão acusou os sociais-democratas de fazerem "insinuações", mas no final alertou Pinho de que a comissão de inquérito terá outras "competências e poderes". "Haverá mais oportunidades", ouvia-se na sala.

"Acho [o silêncio] despudoradamente anormal! Tem de ser investigado pelo poder judicial e pelo poder político, do PS em particular, porque foi pela mão do PS que foi a ministro", reagiu ao PÚBLICO a eurodeputada Ana Gomes.

"Não me passa pela cabeça que um ex-ministro não dê explicações sobre o que fez no exercício das suas funções", afirmou também ao PÚBLICO João Cravinho, ex-ministro do PS, sublinhando que as suspeitas que existem não têm que ver com a vida pessoal mas com funções políticas.

Já o presidente do PS e líder da bancada, Carlos César, limitou-se a comentar, ao PÚBLICO, que Pinho "terá necessariamente que o dizer [dar explicações] na investigação judicial". Ontem à noite na SIC Notícias, Carlos César diria ainda que a forma como Pinho se dirigiu aos deputados "foi infeliz e arrogante".

Estes três socialistas de peso foram algumas das vozes que se indignaram publicamente em Abril contra Manuel Pinho. A notícia de que o antigo ministro teria recebido por mês 16 mil euros do GES enquanto estava no Governo, avançada pela Sábado, mereceu duras críticas do PS e mesmo pedidos de explicações com urgência - o que afinal acabou por não acontecer. Os socialistas mais indignados tinham sido Carlos César, João Galamba, Ana Catarina Mendes, Ana Gomes e João Cravinho. Na altura, consideraram que as suspeitas em torno de Pinho estavam a prejudicar o PS, "envergonhando" mesmo o partido e que, por isso, deviam ser rapidamente esclarecidas.

A promessa das explicações fica adiada para a sua futura passagem pela comissão de inquérito às rendas da energia, esperando-se que isso fique agendado para depois de Pinho ser "confrontado" na investigação que está em curso e "perceber o que está em causa", já que essa é condição sine qua non para poder falar no Parlamento, como disse à saída da audição o seu advogado, Ricardo Sá Fernandes. E isso inclui a ida à comissão de inquérito, admitiu ao PÚBLICO. Pinho "viu a sua reputação destruída. Foi massacrado com base em notícias retiradas de um processo em que ainda não foi ouvido", alegou o advogado.

Mas foi até Pinho quem propôs colaborar mais tarde. "Espere pela minha vinda à comissão das rendas e falaremos sobre a minha resolução de gravíssimos casos empresariais no sector da energia. Tenho informação muito interessante", disse, prometendo à bloquista Mariana Mortágua ir mais atrás do que 2004.

Perguntas por responder

Do PSD, BE, CDS e PCP vieram perguntas sobre qual a sua ligação (directa ou indirecta) às diversas empresas offshore relatadas na investigação, se tinha recebido dinheiro através delas, quanto, em que período, e de onde ele provinha; se tinha prestado todas as declarações correctas nos registos de interesses no Parlamento, nas declarações de rendimentos e património junto do Tribunal Constitucional; de onde vinham os 490 mil euros declarados por dois meses de trabalho no GES em 2005 - "se os declarei é porque os ganhei", limitou-se a dizer; qual a sua ligação ao GES antes e depois de entrar para o Governo de José Sócrates; como foi o processo de compra de uma casa em Lisboa a um fundo do BES; quais as condições negociadas com o GES sobre a sua futura reforma; quais as suas ligações à EDP antes e durante as suas funções no Governo; se se considerava imparcial como ministro a decidir sobre o GES e a EDP. A todas as perguntas Manuel Pinho replicou "não vou responder" ou simplesmente com silêncio. "Não sou político e não tenho cartão nenhum em nenhum partido. Mas não é por não ter cartão político que tenho menos direitos que os senhores", atirou.

O PSD leu esse silêncio como "extremamente esclarecedor", o CDS-PP avisou que é também uma forma de "populismo", e o BE salientou que são questões que mostram que há um "esquema Mensalão" em Portugal.

Manuel Pinho não poupou nas ironias e em ataques - até mesmo ao PS -, e nos elogios ao PCP e ao Bloco. Defendeu a redução da factura da electricidade, que apelidou de "vaca leiteira" por servir para financiar toda a gente, através do fim da taxa para a RTP e da redução do IVA (que é igual para a luz, "as jóias, casacos de pele e barcos de recreio"). Defendeu que os CMEC representam apenas dois euros em cada 40 da factura, mas atirou as culpas da sua criação e dos restantes contratos para o PSD, que foi o "pai dos CMEC e a mãe das barragens".

Manuel Pinho vincou por três vezes partilhar "da opinião da maioria dos portugueses" de que a energia em Portugal "é cara, muito cara", que "há um trânsito enorme entre a política e as empresas" e que "a venda de empresas estratégicas causa polémica" - afirmações que causaram o escárnio dos deputados.

Pinho impede MP de o interrogar


Fim

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