Grécia cede a pressões franco-alemãs e referenda permanência no euro

Europeus e FMI suspendem empréstimos de 8 mil milhões de euros já previstos para Atenas até que seja realizado o referendo, a 4 ou 5 de Dezembro

Georgios Papandreou, primeiro ministro grego, cedeu ontem à pressão da França e da Alemanha e antecipou de Janeiro para o início de Dezembro (para 4 ou 5) a data do referendo que anunciou na segunda-feira, alterando igualmente a questão que será colocada aos eleitores.

Em vez de serem consultados sobre o novo plano de resgate acordado pela zona euro a 27 de Outubro, como prometido pelo chefe do governo, os eleitores gregos vão ter de se pronunciar sobre a permanência do país na zona euro, exactamente como Paris e Berlim pretendiam.

"Não é o momento de dar a redacção exacta, mas a essência é que não será apenas uma questão de programa [de resgate], mas uma questão de saber se queremos permanecer na zona euro", afirmou Papandreou.

Estes esclarecimentos foram feitos ontem à noite pelo chefe do governo grego depois de uma reunião de emergência realizada em Cannes a pedido de Angela Merkel e Nicolas Sarkozy, líderes da Alemanha e França, para explicar as razões que o levaram a anunciar, de forma totalmente inesperada, a realização de um referendo que põe em risco a nova estratégia contra a crise da dívida acordada pela zona euro há uma semana.

A irritação de Merkel e Sarkozy estava ontem patente com a firmeza com que lidaram com o novo problema que provocou uma nova vaga de nervosismo nos mercados financeiros. Segundo Merkel, o tom da conversa ao jantar com Papandreou, que juntou igualmente os responsáveis das principais instituições europeias, foi "firme e duro".

"A Grécia quer ou não permanecer na zona euro? Esperamos que sim", e "é sobre esta questão" o povo grego "se deverá pronunciar se for organizado um referendo", frisou Sarkozy.

Merkel deixou por seu lado implícito que se os gregos optarem por sair do euro, não será uma catástrofe. "Gostaríamos mais de concretizar a estabilização da zona euro com a Grécia do que sem ela, mas este objectivo da estabilização do euro é mais importante", afirmou.

Os dois líderes avisaram igualmente Atenas de que não receberá mais dinheiro da zona euro até ao referendo, e enquanto não confirmar os compromissos assumidos como contrapartida da ajuda europeia. A decisão implica a suspensão imediata da sexta parcela, no valor de 8 mil milhões de euros, do primeiro programa de resgate (aprovado em Maio de 2010) e cujo desembolso já tinha sido aprovado pelos governos europeus há duas semanas.

"Dissemos claramente às autoridades gregas, da maioria mas igualmente da oposição (...), que os europeus e o FMI não poderão prever o desembolso da sexta parcela do programa de ajuda à Grécia antes de a Grécia ter adoptado a totalidade do pacote de 27 de Outubro e que toda a incerteza sobre o resultado do referendo seja levantada", afirmou Sarkozy no final do encontro. "Os nossos amigos gregos têm de decidir se querem continuar o caminho connosco", sublinhou.

Segundo os responsáveis da zona euro, Atenas não precisa de dinheiro antes do início de Dezembro, precisamente a data que pressionaram para a realização do referendo.

Plano sem renegociação

O FMI, que assegura um terço do montante em causa, ainda não se tinha pronunciado sobre este desembolso devido a dúvidas sobre o cumprimento do programa de ajustamento que acompanha a assistência financeira. As regras da instituição não lhe permitem ajudar países que não apresentem perspectivas claras de sustentabilidade da sua dívida num horizonte de doze meses.

O segundo plano de resgate, aprovado a 27 de Outubro no valor de 130 mil milhões de euros (100 mil milhões em empréstimos e 30 mil milhões em garantias sobre a nova dívida adquirida por privados) destinava-se precisamente a cumprir este requisito. Christine Lagarde, directora-geral do FMI, que participou nas negociações do novo pacote, dispunha-se assim a propor ao conselho de administração da instituição o desembolso da sexta parcela da ajuda em curso.

Os seus vinte e quatro países ou grupos de países, deveriam pronunciar-se em meados deste mês, mas a perspectiva do referendo, que põe em dúvida a concretização do novo plano de resgate - e consequentemente, a sustentabilidade da dívida grega - não lhes permite assumir uma posição positiva. Ontem, Lagarde confirmou o adiamento da decisão. "Logo que o referendo estiver concluído, e todas as incertezas ultrapassadas, farei uma recomendação do conselho de administração do FMI sobre a sexta parcela do nosso empréstimo para apoiar o programa económico da Grécia", afirmou Lagarde em comunicado.

Os encontros de ontem decorreram à noite em Cannes, a cidade do sul de França que acolhe a partir de hoje uma cimeira de dois dias do G20 (o grupo das maiores economias do Mundo a par das principais emergentes), que deveria constituir a ocasião para os responsáveis europeus sossegarem os Estados Unidos e a China sobre a resolução da crise, mas que está em vias de se transformar numa cimeira para salvar a zona euro.

A antecipação da data do referendo que, segundo Papandreou se realizará por volta de 4 de Dezembro, destina-se a encurtar ao máximo o período de incerteza sobre os riscos de uma rejeição pelos eleitores. Esta incerteza fragiliza a estratégia anti-crise aprovada pela zona euro na semana passada, que, além do segundo plano de resgate grego inclui o perdão por parte dos credores privados de 100 mil milhões de euros dos 350 mil milhões da dívida grega, um plano de recapitalização dos bancos europeus e o reforço dos meios do Fundo de Estabilidade (FEEF) através de um complexo processo de "alavancagem" para proteger a Itália e a Espanha. "A Europa não poderá permanecer durante longas semanas suspensa da resposta do referendo", avisou o primeiro-ministro francês, François Fillon, no parlamento.

Paris e Berlim deixaram igualmente claro que o novo programa grego não é passível de ser renegociado e que terá de ser aplicado tal como foi aprovado pela zona euro, contrariando de antemão as pretensões gregas de alteração dos seus termos. Paris e Berlim esperam aliás que Papandreou, que será submetido na sexta-feira a um voto de confiança no parlamento, coloque logo a seguir o plano de resgate à aprovação dos deputados de modo a atenuar a incerteza e o nervosismo dos mercados.

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