Europa mobiliza-se para travar contágio aos grandes e não deixar solução para BCE

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Berlusconi disse ontem que a crise se deve "à especulação" TONY GENTILE/REUTERS

Durão Barroso apelou ontem aos líderes europeus para que implementem "rapidamente" as decisões da cimeira de Julho. Itália e Espanha tentam tranquilizar os mercados

Agosto promete ser tudo menos um mês tranquilo de férias para os líderes da zona euro. Com os juros da dívida italiana e espanhola sob pressão, as autoridades europeias desdobraram-se ontem em contactos telefónicos e reuniões de emergência para evitar que a crise soberana chegue às grandes economias.

Bruxelas elevou o tom, pedindo a implementação urgente das decisões tomadas na última cimeira da zona euro, sob pena de deixar nas mãos do Banco Central Europeu (BCE) a decisão de "salvar" ou não a Itália e a Espanha. Por mais "injustificada" que Bruxelas considere a pressão dos mercados, as taxas de juro da dívida italiana e espanhola estão em níveis recorde, acima dos seis por cento, aproximando-se do patamar insustentável que obrigou Grécia, Irlanda e Portugal a pedirem ajuda externa.

Os líderes europeus mobilizaram-se em contactos com o chefe de Governo espanhol, José Luis Rodríguez Zapatero, a conversar por telefone com o presidente do Conselho Europeu, Herman Van Rompuy, e com o ministro das Finanças italiano, Giulio Tremonti. Este último esteve, também, reunido com o líder do Eurogrupo, Jean-Claude Juncker. A conversa foi "produtiva" e percorreu "todos os problemas que a zona euro está a enfrentar", afirmaram, mas não foram revelados mais detalhes.

Em Madrid, a preocupação é tanta que, segundo o jornal Expansion, o Tesouro e o Banco de Espanha contactaram ontem operadores de mercado para perceber o "apetite" para o leilão de dívida de hoje. Em Itália, onde a instabilidade e as divisões políticas têm exacerbado os problemas, a pressão dos mercados levou o primeiro-ministro ao Parlamento.

Silvio Berlusconi defendeu que o país "não merecia ser punido pelos mercados" e que tem "fundamentos sólidos", salientando que os bancos italianos, profundamente expostos à dívida do Estado, "têm liquidez e são solventes". "A crise na Itália deve-se à especulação", garantiu, avançando com algumas intenções vagas para tentar tranquilizar os mercados: a possível extinção ou fusão de organismos públicos e a promessa de que o Governo irá trabalhar num acordo com os sindicatos para uma reforma das leis laborais.

A Comissão Europeia (CE) que, na terça-feira, tinha manifestado "plena confiança" nas reformas de Roma e Madrid e garantido que não está a ser planeado qualquer resgate às grandes economias do euro, deu ontem sinais de alarme. O presidente da CE, Durão Barroso, admitiu que as tensões no mercado da dívida reflectem a "crescente preocupação dos investidores com a capacidade sistémica da zona euro de responder à crise".

Durão Barroso considerou que a pressão dos mercados é "injustificada", mas reconheceu que é preciso enviar-lhes "um sinal sem ambiguidade", ou seja, implementar "rapidamente" o que ficou decidido na cimeira de 21 de Julho, onde foi aprovado o novo pacote de ajuda à Grécia. O presidente da CE disse mesmo que iria escrever uma carta aos chefes de Estado da zona euro a pressionar para uma aplicação rápida das medidas da cimeira, que prevêem linhas de crédito preventivas aos países em dificuldades e dão ao Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (FEEF) poderes para comprar dívida pública, o que poderia aliviar as taxas de juro italianas e espanholas.

BCE, o último recurso?

Contudo, como as medidas da cimeira ainda têm de ser aprovadas pelos parlamentos de alguns países, dificilmente serão implementadas antes de Setembro. Isso deixa a Europa de mãos atadas caso a pressão dos mercados sobre a terceira e a quarta maiores economias do euro se agrave ainda mais. E o problema pode acabar por aterrar nas costas do BCE.

A autoridade monetária reúne-se hoje em Frankfurt para decidir sobre as suas taxas de juro de referência, mas deverá ser "bombardeada" de questões sobre a situação da Itália e de Espanha. Antes de Portugal, da Grécia ou da Irlanda pedirem ajuda, o BCE tentou acalmar os investidores comprando títulos de dívida desses países no mercado secundário.

E, apesar de já ter deixado essas compras há vários meses e mostrar pouca vontade de repetir, poderá ver-se pressionado a tal para inverter a escalada dos juros da dívida. Ainda para mais quando, em Itália e em Espanha, a margem de manobra aparenta ser pouca. Há menos de um mês, o Governo de Berlusconi anunciou um novo plano de austeridade, de 48 mil milhões de euros, que coloca o país em equilíbrio orçamental até 2014. E em Espanha, que tem anunciado reformas atrás de reformas, Zapatero convocou eleições antecipadas para Novembro.

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