Escândalos sem fim

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É provável, como já alguém sugeriu, que toda a gente esteja farta de escândalos. Têm sido, de facto, muitos nos tempos recentes e quase todos bem à portuguesa: metendo dinheiro, gente poderosa e indícios de promiscuidade ou corrupção.

Só em torno de José Sócrates tivemos vários, do Freeport à operação PT/TVI, que ainda não terminaram; depois, na banca, o BPN e o BPP, cuja falência começou a ser preparada na semana passada, a primeira vez que o Banco de Portugal cassa a licença a um banco. E agora o escândalo dos submarinos, que ressurgiu com força no contexto da investigação alemã a supostas falcatruas na venda dos submarinos à Ferrostaal, parcialmente divulgada pela revista Der Spiegel. O escândalo envolve milhões, relações financeiras complexas, contrapartidas que parece que nunca existiram nem irão existir, e é mais uma dor de cabeça para Paulo Portas, que assinou os contratos de aquisição como ministro da Defesa. Tudo isto junto, provoca, é verdade, um certo cansaço.

Aquilo de que o público se fartou por completo não é, no entanto, desta infinita série de escândalos mas de outra coisa. Infelizmente, o risco de que nada se esclareça, de que nada seja apurado, de que nenhuma responsabilidade (política ou penal) seja efectivada, é real e rotineiro. E é esse cinismo de base que inibe hoje o burgo de esperar o que quer que seja de qualquer escândalo e de qualquer investigação. "Não vai dar em nada", é o que mais se ouve por aí. Não tem dado. E ninguém percebe porquê.

No BPN, houve saque que o Estado e os contribuintes cobriram; no BPP, a coisa foi de um aventureirismo e excesso de gula que só podia acabar mal e deixou gente descalça. No Freeport, independentemente da posição de Sócrates, ninguém tem dúvidas sobre as anomalias que envolveram aquele licenciamento pressuroso. No caso PT/TVI, é o que sabemos e, no mais recente escândalo dos submarinos, é todo um negócio em que as contrapartidas superaram o preço da aquisição em 400 milhões de euros que surge como suspeito e como fonte de fraude e desperdício. Por que motivo Luís Amado classificou as contrapartidas como um "embuste"?

O que matou a indignação do português perante a fiada de escândalos que lhe têm aparecido não foi o excesso e a proliferação de casos em que, de resto, até temos sido cautelosos. Foi este sentimento absurdo de que nada acontece. Não sabemos se por imperícia do Ministério Público ou se porque o Estado português é fácil de enganar. Mas é por essa ausência de consequências, de responsabilidades, que a exaustão tem germinado.

Em plena crise, e com a nossa credibilidade financeira em queda, não há dúvidas de que o país tem muitos problemas urgentes. O problema é que uns problemas não afastam outros problemas. E os desmandos com negócios públicos são uma das nossas chagas mais preocupantes.

Se há crime, tem de haver responsáveis, seja qual for o Governo, o partido, o espectro político. Não há uma corrupção de esquerda nem de direita. Nem há os escândalos de um partido contra os dos outros. Quem vir o problema nesses termos, só mostra a sua enorme irresponsabilidade política e a sua vontade em que nada se esclareça.

Curiosamente, os mesmos que protestaram contra a judicialização da política no Freeport e no Face Oculta e contra o aproveitamento político de casos judiciais divulgados pela imprensa, não perderam tempo, mal se ouviu o sino do escândalo dos submarinos, de virem a público denunciar este caso e exigir esclarecimentos e responsabilidades. Não os critico, precisamente porque a corrupção não tem ideologia. Só sugiro que dediquem à imprensa portuguesa o mesmo tempo que parecem dedicar à Spiegel. Jurista

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