Morreu o histórico do PCP Dias Lourenço

Foto
Funeral de Dias Lourenço realiza-se hoje em Lisboa CARLOS LOPES

Morte põe termo a quase sete décadas de militância de um dos mais importantes dirigentes do PCP

Há quem considere, desde então, que só por milagre António Dias Lourenço - ontem falecido - não morreu em 1954, quando, num acto que sempre assumiu como calculado, se lançou das muralhas do forte-prisão de Peniche para as ondas que em baixo rebentavam nas rochas e na própria parede de pedra, protagonizando a mais espectacular e arriscada fuga individual de um preso político das cadeias políticas do Estado Novo. Levado pelo mar, acabaria por ser recolhido por pescadores na praia, a quem disse quem era e que o acolheram até recuperar forças e o ajudaram a voltar à liberdade e à luta clandestina contra o regime na qualidade de revolucionário profissional do PCP.

Mais de meio século passado que dedicou sempre ao PCP, Dias Lourenço morreu ontem, aos 95 anos de idade, estando o seu corpo em câmara ardente na casa mortuária da Igreja de São Francisco de Assis, em Lisboa. O funeral sai hoje, domingo, às 16h30, para o Cemitério do Alto de São João, onde será cremado pelas 17h30.

Um reorganizador em 1940

Dias Lourenço era talvez mais popular e amistoso dirigente histórico do PCP, que pertencia ainda à geração da refundação do partido em 1940 - ou seja, à geração de Álvaro Cunhal. E a sua importância histórica é imensa, sendo a sua vida um exemplo de abnegação revolucionária e de entrega à luta por um ideal e um projecto político.

Nascido em Vila Franca de Xira em 1915, Dias Lourenço integrou em 1932, aos 17 anos de idade, as fileiras do então já clandestino PCP, no que foi uma opção de vida.

Fazendo parte do núcleo de dirigentes que, liderados por Júlio Fogaça, procederam à chamada reorganização do PCP, em 1940/41, Dias Lourenço foi responsável pela construção do aparelho clandestino do partido no Baixo Ribatejo, integrando o Comité Regional. É nesse processo que, em 1942, mergulha na clandestinidade e assume ainda a responsabilidade pelas tipografias e pelo aparelho central da distribuição da imprensa comunista.

Preso 17 anos

Também no início dos anos 40, é um dos principais organizadores dos Passeios no Tejo, encontros que consistiam em viagens de barco que juntavam tertúlias intelectuais, que contaram com a participação de Álvaro Cunhal, Soeiro Pereira Gomes ou Alves Redol e estiveram na génese do movimento neo-realista português. Preso duas vezes, perfez um total de 17 anos nas prisões políticas: entre 1949 e a fuga de 1954 e de 1962 a 1973.

Integrou o Comité Central do PCP no congresso da reorganização em 1943 (o primeiro na clandestinidade) e permaneceu neste órgão até 1996. Foi um dos organizadores das greves de Julho e Agosto de 1943 e de Maio de 1944. Organizou também as acções que se realizaram a propósito do Primeiro de Maio de 1962 e foi responsável, antes do 25 de Abril, pelas organizações regionais do PCP do Alentejo, do Algarve e das Beiras. Já depois de 1974 foi responsável pelas organizações regionais do Oeste e Ribatejo e das Beiras.

Ainda como dirigente clandestino do PCP, em 1943, Dias Lourenço representou o partido no Conselho Nacional do Movimento de Unidade Nacional Antifascista (MUNAF). Na direcção do PCP, integrou o Secretariado entre 1957 e 1962 e a Comissão Política em 1956 e entre 1974 e 1988. Foi ainda responsável pelo Avante! de 1957 a 1962 e director desde Abril de 1974 até 1991.

Já em democracia, foi deputado à Assembleia Constituinte em 1975, tendo depois sido sucessivamente eleito para a Assembleia da República entre 1976 e 1987.

Sugerir correcção