PSD avança e PCP recua na abertura de uma crise política

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Sócrates quer estabilidade, Passos quer reformas Nuno Ferreira Santos

Jerónimo trava apresentação de moção de censura, enquanto Miguel Relvas afirma que o PSD espera o "momento político adequado"

"As avaliações são permanentes, estamos à espera do momento político". A frase, deixada cair ontem pelo porta-voz do PSD, Miguel Relvas, no meio de declarações em que tentava afastar a incómoda pergunta sobre moções de censura, representou o passo em frente dos sociais-democratas sobre a possibilidade de desencadear uma crise política. Isto no mesmo dia em que Jerónimo de Sousa, de visita à Madeira, fez o PCP recuar nessa iniciativa e avisou a direita para não contar com os comunistas para "uma manobra de tomada de poder".

A queda do Governo de José Sócrates está no topo das preocupações dos políticos. Incluindo do próprio primeiro-ministro, que logo na manhã de ontem criticava o "discurso político absolutamente lamentável" sobre crises políticas que vão contra "a defesa do país". "Todos os países enfrentam um momento de governação de grande dificuldade", afirmou à chegada ao Congresso das Exportações, em Santa Maria da Feira, acrescentando que "este não é momento para que a política se entretenha a discutir questões de poder". "O dever das lideranças políticas é empenharem-se na defesa do seu país", frisou.

O PSD fez que não ouviu e ao fim da tarde, no final da reunião da comissão política do partido, Miguel Relvas subiu o tom de críticas ao Governo. Acusou-o de deixar o país "à deriva" por mostrar "uma total ausência de vontade e de capacidade para tomar as medidas urgentes e necessárias". E exigiu que o executivo "governe".

"A actuação deste Governo e do primeiro-ministro transformou-se numa sucessão de manobras tácticas, sem orientação e sem nexo, que mais não são do que uma fuga para a frente, uma tentativa permanente de mascarar os seus erros e as suas contradições", vincou o responsável social-democrata. Como exemplo de irresponsabilidade, apontou mesmo o Congresso das Exportações, muito apregoado pela "propaganda socialista", mas do qual não saiu "nenhum resultado palpável para as empresas portuguesas". Foi então que, questionado sobre como o PSD se posicionará perante uma moção de censura, Relvas respondeu que a avaliação do partido "será feita no momento adequado" - e ele ainda não chegou. "Ao PSD cabe ser a alternativa, e preparar-se para, se os portugueses assim o entenderem, ser Governo", afirmou o social-democrata, garantindo: "Não estamos ansiosos, temos calma."

PCP trava a fundo

Menos calmo se mostrou ontem Jerónimo de Sousa na Madeira, perante as insistentes perguntas sobre a moção de censura admitida por si, e na véspera pelo seu líder parlamentar, Bernardino Soares. Em diferentes momentos da visita, feita no âmbito da campanha nacional do PCP Portugal a produzir, Jerónimo adiantou que a moção de censura ao Governo não é uma questão que o seu partido coloque neste momento. Trata-se antes de "um instrumento sempre admissível num quadro de agravamento da situação" e "num quadro de mudança de política", esclareceu. Uma travagem a fundo na velocidade que o tema tinha ganho na véspera e ao qual o PSD dava sinais de querer apanhar boleia.

Para que ficasse claro, Jerónimo advertiu as "forças de direita" que não contem com o PCP para "um ensaio e uma manobra de tomada de poder". "Não somos prisioneiros nem cativos das decisões da direita sobre uma moção de censura", repetiu, excluindo, por um lado, a hipótese de o PCP "servir para mudar de protagonistas para continuarem as mesmas políticas", mas, por outro lado, de ser "sustentáculo desta política de direita seguida pelo Governo PS". Jerónimo, aliás, também não acredita que os sociais-democratas avancem com uma moção de censura: "Há uma identificação clara do PSD com estas políticas, por isso quer fundamentalmente que o PS vá assumindo o odioso dessas medidas para capitalizar no futuro", frisou.

Quem mais se afasta do cenário da crise é o BE. Francisco Louçã deixou ontem claro que o BE "não quer a política de direita deste Governo e não quer outras políticas de direita que prejudiquem o essencial da democracia social". "Queremos que haja uma alternativa de esquerda. E é aí que o BE vai estar situado", disse.

Mas não é só na oposição que a queda do Governo é ponderada. O empresário Henrique Neto declarava ontem ao diário i que a saída de Sócrates nas eleições do partido, em Março, é "a única maneira de o PS não ficar durante muitos anos conotado com os erros" do actual líder. "Os erros são tantos, e de tal maneira graves, que põem em causa a independência nacional", acrescentava Neto. Que propunha a substituição de Sócrates por António José Seguro. Este ex-ministro remeteu-se ao silêncio. com L.B.

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