São eles que os vêem todos os dias. podem avaliá-los?

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Aluna da Escola Secundaria Azevedo Neves, Damaia Daniel Rocha

Há uma década, Ronald Ferguson, um economista da Universidade de Harvard, questionava-se acerca do que aconteceria se os professores fossem avaliados pelas pessoas que os vêem todos os dias - os seus alunos. A ideia - tão simples - era revolucionária. E os resultados também o pareciam ser: apresentavam uma notável consistência em todos os níveis de ensino e para lá das separações raciais. Um número crescente de sistemas escolares estão a implementar inquéritos - e poderá ser possível conseguir ultrapassar as resistências dos professores, de forma a relacionar os resultados com os salários e as promoções

Nubia Baptiste já estava há 665 dias na sua escola pública na cidade de Washington quando iniciou o seu segundo semestre, a 27 de Março de 2012. Era uma especialista da Escola Técnica Secundária McKinley. Sabia quais os seguranças de que devia ser amiga e onde se devia esconder quando queria faltar às aulas (experimentem por baixo das bancadas do campo de jogos). Sabia quais eram os professores que ficavam até mais tarde a escrever cartas de recomendação para estudantes; sabia quais eram os que patrulhavam os corredores como guardas numa prisão, gritando aos miúdos para que dispersassem.

Se lhe perguntassem, podia revelar coisas acerca da sua escola que nenhum adulto poderia saber. Quando começava a falar, tinha muito para dizer. Mas até essa manhã da sua última Primavera como finalista, nunca ninguém lhe tinha perguntado.

Sentou-se à secretária e puxou o seu longo cabelo, com dreadlocks à rasta, para trás dos ombros. E então a sua professora entregou-lhe um formulário. Deve ser outro teste de escolha múltipla, pensou Nubia, mais um para ser feito e esquecido. Pegou no seu lápis. O único som que se ouvia era o zumbido do ar condicionado.

"Os professores no átrio tratam-me de forma respeitosa, mesmo que não me conheçam."

Bem, isto era algo diferente. Escolheu uma resposta de uma lista de possibilidades: "Por vezes."

"Esta aula parece uma família feliz."

Franziu as sobrancelhas. Isto era alguma brincadeira? "Totalmente falso."

Em várias cidades ao longo dos Estados Unidos, no ano lectivo 2011-2012, cerca de 250 mil estudantes responderam a um inquérito especial destinado a tentar captar o que eles pensavam dos seus professores e do ambiente nas suas salas de aula. Ao contrário da grande maioria dos inquéritos na história da Humanidade, este tinha sido cuidadosamente testado em campo. A pesquisa tinha mostrado algo notável: se se fizesse aos jovens as perguntas certas, eles conseguiam identificar, com imensa exactidão, quais eram os professores mais - e menos - competentes.

A situação era tão óbvia que chegava a ser embaraçosa. Os miúdos olhavam para os seus professores ao longo de centenas de horas em cada ano lectivo, o que pode explicar a sua capacidade e perspicácia. As suas respostas ao inquérito, percebeu-se, eram mais fiáveis do que qualquer outra medida de performance de professores - incluindo observações na sala de aula e subida dos resultados dos testes de avaliação dos alunos. Tudo isto levantava uma questão nova e perturbadora: deverão os professores ser pagos, formados ou despedidos com base, em parte, naquilo que as crianças dizem deles?

Para descobrir a resposta, responsáveis escolares num punhado de cidades têm estado discretamente a testar o inquérito. Na capital federal, neste ano, seis escolas participaram num projecto-piloto, e a revista The Atlantic teve acesso e pôde observar o processo de quatro meses, do princípio ao fim.

Na Escola McKinley, que atrai alunos das áreas de Ciências, Tecnologias, Engenharia e Matemática, Nubia Baptiste marcou bolinhas para responder às 127 perguntas. Depois colocou as folhas dentro do envelope que lhe tinham entregue e selou-o.

Mais tarde, no átrio, tentou perceber o que tinha acabado de acontecer. Não batia certo com as suas experiências anteriores. "Nunca ninguém pergunta acerca dos adultos", disse. "É sempre sobre os alunos."

Uma colega ao seu lado abanou a cabeça. "Deviam ter feito isto desde quando eu estava no 8.º ano."

Ao longo da última década, os reformadores da educação a nível mundial têm-se mostrado obcecados com a qualidade do ensino. Estudo após estudo, mostraram que é mais importante do que qualquer outro factor na escola - e que em muitos locais é muito baixa. Para que todos os miúdos obtenham capacidades adaptadas ao século XXI, o ensino tem de melhorar - de qualquer forma.

Nos Estados Unidos, a estratégia tem sido colocar os responsáveis escolares a avaliarem a actuação dos professores mais frequentemente e mais seriamente do que no passado, quando as avaliações eram invariavelmente positivas. Esperava-se que um professor melhorasse através de uma combinação de pressão e feedback - ou então seria substituído por alguém melhor. No início deste ano, quase metade dos estados exigiam que as avaliações dos professores se baseassem parcialmente nos resultados dos testes de avaliação dos alunos.

Até agora, esta revolução tem sido muito ruidosa mas pouco satisfatória. A maioria dos professores não considera que dados de testes de avaliação forneçam uma medida acertada daquilo que os alunos aprenderam. Complexos algoritmos que ajustam o nível de rendimentos e a raça dos alunos têm tornado as avaliações baseadas nos testes de avaliação mais justas - mas são geralmente contestadas e mal compreendidas pelos professores, que ficam ressentidos com elas.

Entretanto, todo o debate acaba por ser irrelevante nas salas de aulas. Apesar de todos os testes nas escolas norte-americanas, a maioria dos professores continua a não ensinar as matérias ou os níveis de escolaridade abrangidos pelos testes normalizados obrigatórios. Assim, não existem dados dos testes de avaliação com que eles possam ser julgados. Como resultado, continuam a ser avaliados pelos seus directores, que de vez em quando assistem às suas aulas e avaliam o seu trabalho da forma que os directores sempre fizeram - sem grande exactidão, detalhe ou imparcialidade. Mesmo em Washington, que tem sido a cidade que mais agressivamente tem usado resultados de testes de avaliação para recompensar ou despedir professores, esses dados apenas têm sido recolhidos para 15 em cada 100 professores. A proporção está a aumentar em escolas públicas de Washington e de outras cidades à medida que as escolas acumulam mais testes, mas, por agora, apenas uma minoria de professores pode ser avaliada desta forma.

Mas, mesmo que existissem dados de testes de avaliação para toda a gente, quão informativos poderiam efectivamente eles ser? Resultados de testes de avaliação podem mostrar quando é que os miúdos não estão a aprender; não podem revelar porque é que eles não estão a aprender. Eles podem levar os professores a acalmarem-se ou a entrarem em desespero - mas não podem ajudar os professores a melhorar. Os inquéritos focam-se nos meios, não nos fins - dar aos professores ideias concretas acerca do que podem consertar agora mesmo, directamente das cabeças das pessoas que se sentam, à frente deles todo o dia.

Há uma década, um economista da Universidade de Harvard de nome Ronald Ferguson deslocou-se ao estado do Ohio para ajudar um pequeno agrupamento escolar a perceber por que razão as crianças negras tinham piores resultados nos testes quando comparadas com as crianças brancas. Fez todo o tipo de coisas para analisar as crianças das escolas de Shaker Heights, um subúrbio de Cleveland. Talvez porque tinha crescido naquela zona ou porque, ele próprio era afro-americano, suspeitou de que nas salas de aula actuavam forças poderosas de que os professores não se apercebiam.

Por isso, Ferguson acabou por entregar aos miúdos de Shaker Heights um inquérito - não acerca de toda a escola, mas sim acerca das suas salas em particular. Os resultados eram contraditórios. O mesmo grupo de crianças respondeu de forma diferente de uma sala para outra, mas as diferenças não tinham muito que ver com a raça, como se esperava; de facto, os estudantes brancos e os estudantes negros em geral concordavam.

A variação tinha de se relacionar com os professores. Numa aula, as crianças diziam que trabalhavam muito, prestavam atenção e corrigiam os seus erros; gostavam de estar lá, e acreditavam que o professor se preocupava com elas. Na aula seguinte, as mesmas crianças relatavam que o professor tinha dificuldades ao explicar as coisas e que não percebia quando os alunos não conseguiam perceber uma lição.

"Sabíamos que as relações que professores criavam com os alunos eram importantes", diz Mark Freeman, superintendente do Agrupamento Escolar de Shaker Heights. "Mas ver a prova disso nos inquéritos fez uma grande diferença. Percebemos que os resultados eram extremamente úteis."

De volta a Harvard, ninguém ligou muito ao estudo de Ferguson. "Quando tentava falar dele aos meus colegas investigadores, eles não se mostravam interessados", conta, a rir. "As pessoas simplesmente mudavam de assunto."

Por fim, em 2009, a Fundação Bill & Melinda Gates lançou um gigantesco projecto para estudar 3000 professores em sete cidades e perceber o que os tornava tão eficientes - ou ineficientes. Thomas Kane, colega de Ferguson, liderava o imenso estudo, denominado Medidas de ensino eficaz. Ele e os seus colegas investigadores delinearam muitos instrumentos elaborados para medir a eficácia, incluindo retrocessos estatísticos que acompanhavam os resultados dos testes de alunos ao longo do tempo e imagens de câmaras de vídeo panorâmicas que gravaram milhares de horas de actividades em salas de aula.

Mas Kane também queria incluir as percepções dos alunos. E assim se lembrou do estudo de Ferguson, de que ele tinha ouvido falar em Harvard. Com o auxílio de Ferguson, Kane e os seus colegas entregaram uma versão reduzida do inquérito às centenas de milhares de estudantes do projecto de investigação - e compararam os resultados com os testes de avaliação e outras medidas de eficácia. As respostas efectivamente previam em que classes haveria uma melhoria nos resultados dos testes de avaliação. Em Matemática, por exemplo, os professores que tinham sido mais positivamente avaliados pelos estudantes conseguiram dar cerca de mais seis meses de matéria do que os professores com os menores níveis de aprovação. (Em comparação, os professores com mestrado - uma das formas de se conseguir um aumento de salário em muitas escolas - apenas conseguiam dar mais um mês de matéria por ano do que os professores sem mestrado.)

Os estudantes estavam mais bem preparados do que os observadores adultos para avaliar professores. Isto não porque fossem mais espertos, mas porque tinham tido meses para formar uma opinião, por oposição a apenas meia hora. E havia dezenas deles, e não apenas um director. Mesmo que um miúdo tivesse uma embirração com um professor ou simplesmente estragasse o inquérito, a sua resposta sozinha não conseguiria alterar a média.

"Existem alguns alunos, cabeças-duras que simplesmente estragam o inquérito e não o levam a sério", explica Ferguson, "mas são muito raros". Estudantes que não lêem as perguntas podem dar a mesma resposta a cada questão. Mas quando recentemente Ferguson examinou 199 mil inquéritos, descobriu que menos de 0,5% dos estudantes o fez nas primeiras dez questões. As crianças, acredita ele, acham as perguntas interessantes, por isso tendem a prestar atenção. E a resposta "certa" muitas vezes não é óbvia, pelo que miúdos que querem dar cabo dos resultados podem não saber como o fazer.

Mesmo crianças pequenas conseguem avaliar os seus professores com relativa exactidão - isto para surpresa de Kane. De facto, a única coisa que os investigadores encontraram para melhor prever as melhorias de um professor nos resultados dos testes de avaliação foi... melhorias em resultados de testes de avaliação anteriores. Mas, para além de serem odiados pelos professores, esses dados são volúveis. Um professor pode ser considerado como muito eficiente num ano de acordo com os ganhos nos testes de avaliação dos estudantes e ineficiente no ano seguinte, em parte devido a mudanças na composição da turma que têm pouco que ver com a sua actuação - digamos, ter na sua turma os dois piores desordeiros ou as miúdas mais mazinhas da escola.

Os resultados dos inquéritos não se alteram segundo a raça ou rendimento - o que acontece com os testes de avaliação, que podem melhorar conforme a escola tenha mais alunos brancos ou de maior nível económico.

Os inquéritos a estudantes, por seu lado, são menos voláteis. As respostas dos miúdos face a um determinado professor, descobriu Ferguson, mantiveram-se semelhantes, de turma para turma e do Outono até à Primavera. E, ainda mais importante, as perguntas conduziram a revelações que os resultados dos testes de avaliação não conseguiram: acima e para além de adquirir capacidades académicas, o que é realmente passar um ano numa sala de aula? Trabalhou mais nesta sala do que em qualquer outra? As respostas a estas perguntas são importantes para um estudante durante muitos anos, muito depois de ter esquecido as equações de segundo grau.

O inquérito não pergunta "Gostas do teu professor? O teu professor é simpático?" Isto não é um concurso de popularidade. O inquérito coloca sobretudo perguntas acerca daquilo que os estudantes vêem todos os dias.

Dos 36 itens colocados no estudo da Fundação Gates, os cinco que mais se relacionavam com a aprendizagem do aluno eram muito directos:

1. Os alunos nesta aula tratam o professor com respeito.

2. Os meus colegas comportam-se da forma que o meu professor deseja.

3. Na nossa aula está-se sempre ocupado e não se perde tempo.

4. Nesta aula, aprendemos muitas coisas quase todos os dias.

5. Nesta classe, aprendemos a corrigir os nossos erros.

Quando Ferguson e Kane partilharam estes resultados em conferências, os professores ficaram surpreendidos. Tinham noção de que era importante tomar conta dos miúdos, mas o mais importante, de acordo com o estudo, era se os professores controlavam a turma e se a tornavam num lugar de desafios. Como cada um de nós se lembrará do seu tempo de escola, estas duas condições nem sempre coexistem: alguns professores tinham altos níveis de controlo, mas baixos níveis de rigor.

Depois da publicação dos resultados da investigação da Gates, em 2010, o estudo de Ferguson ganhou credibilidade estatística. Na altura, o trabalho diário tinha ficado nas mãos da Cambridge Education, uma empresa de consultoria que ajudava os agrupamentos escolares a analisar o estudo. (Ferguson continua a receber uma percentagem dos lucros pelo trabalho de inquérito.)

De repente, dezenas de agrupamentos quiseram experimentar o inquérito, quer através da Cambridge ou pelos seus próprios meios - em parte por causa dos incentivos federais a uma avaliação de professores mais rigorosa, usando múltiplos parâmetros. No último ano lectivo, Memphis adoptou o primeiro sistema escolar no país a ligar o inquérito às avaliações anuais dos professores; os inquéritos contavam 5% na avaliação. Essa proporção pode vir a subir. (Outros 35% estavam relacionados com a subida ou descida das notas dos alunos e 40% com as observações de aula.) No final do ano, alguns professores de Memphis foram dispensados devido aos maus resultados - mas foram menos de 2%.

O The New Teacher Project, uma organização sem fins lucrativos de Brooklyn que recruta e treina novos professores, usou no ano lectivo passado os resultados dos inquéritos para avaliar 460 dos seus 1006 professores. "A aparição do feedback dos alunos nas avaliações aos professores constitui um dos principais desenvolvimentos da reforma educativa da última década", afirma Timothy Daly, presidente da organização e antigo professor.

Em Pittsburgh, todos os alunos responderam ao inquérito no ano lectivo passado. Os sindicatos de professores são contra a utilização dos resultados nas avaliações ao desempenho, mas é possível que de qualquer maneira responsáveis educativos o façam num futuro não muito longínquo. No estado da Georgia, os directores da escola irão ter em consideração as respostas dos estudantes quando, este ano, avaliarem os professores. Em Chicago, a partir de Outono de 2013, os resultados dos inquéritos contarão 10% na avaliação dos professores.

Ninguém sabe se as informações dadas pelos inquéritos se tornarão menos fiáveis à medida que ganham peso. (As escolas de Memphis estão neste momento a estudar os seus inquéritos para detectar possíveis distorções e os resultados devem sair este ano.) Kane acha que os inquéritos deviam contar entre 20% e 30% para a avaliação - o suficiente para que professores e directores os levem a sério, mas não o suficiente para levar os professores a aliciarem os alunos ou a fazer batota, pressionando os alunos a responder de uma determinada forma, por exemplo.

Já Ferguson está dividido. É cauteloso com a imposição do que quer que seja aos professores - mas lamenta que seja tão raro as escolas que fazem os estudos utilizarem os seus resultados de forma sistematizada para ajudarem os professores a melhorar. Em média, na última década, apenas um terço dos professores clicou no link que lhes foi enviado para os seus emails para verem os resultados. Provavelmente, mais professores o fariam se os resultados afectassem o seu salário. Por agora, Ferguson instiga as escolas a conduzirem várias vezes o inquérito antes que os façam contar para as avaliações.

Tanto Kane como Ferguson, tal como a maioria dos professores universitários, são avaliados em parte pelos inquéritos aos alunos. A opinião dos alunos é um dos factores das discussões sobre salários e promoções, e estas opiniões estão acessíveis a quem quiser inscrever-se nas escolas onde dão aulas. "Acho que a maioria dos meus colegas os toma a sério, porque a instituição o faz", diz Ferguson. "O nosso desejo de não sermos envergonhados faz-nos, sem dúvida, prestar mais atenção."

Ainda assim, Ferguson estremece ao ler as avaliações. O escrutínio causa-lhe desconforto, admite, ainda que possa ser útil. No ano passado, um aluno sugeriu-lhe que usasse uma apresentação em Power Point para não perder tempo a escrever matéria no quadro. Ele seguiu o conselho, e funcionou bem. Mas algumas opiniões simplesmente ignora. "Eles dizem que não falámos sobre um assunto", diz, "e nós sabemos que falámos dele dez vezes."

Na realidade, as melhores provas a favor - e contra - dos inquéritos aos estudantes vêm da sua longa história nas universidades. Décadas de investigação dizem-nos que os inquéritos têm o valor das perguntas que incluem, do cuidado com que são geridos e das reacções dos professores. Alguns estudos mostram que os alunos aprendem realmente mais nas aulas onde os professores têm avaliações melhores; outros mostram que os professores inflacionam as notas para receber boas avaliações. Até agora, as notas não parecem influenciar significativamente as respostas ao inquérito de Ferguson: em média, os alunos de nota A [nota máxima] avaliam os professores em apenas mais 10% do que os de nota D.

O aspecto mais refrescante do estudo de Ferguson será o facto de os resultados não mudarem drasticamente consoante a raça ou rendimento do aluno. O mesmo não acontece com informações recolhidas pelos testes de avaliação: em todo o país, as notas aumentam (em diferentes graus) dependendo de a escola ter mais ou menos alunos brancos e ricos. Com os inquéritos, o único efeito provocado pelos rendimentos pode ser o oposto: alguns dados revelam que os miúdos com os pais com maiores níveis de escolaridade atribuem notas ligeiramente inferiores aos seus professores. As expectativas dos alunos parecem subir na proporção dos rendimentos da família (um fenómeno que também é observado nos inquéritos sobre cuidados de saúde). Mas, no geral, mesmo nas turmas mais diversificadas, os estudantes tendem a concordar com aquilo que vêem acontecer dia após dia.

Numa sala de jardim-de-infância, a um quilómetro e meio do Capitólio [em Washington], Gerod, de cinco anos, está a avaliar o seu professor. Senta-se numa mesa baixinha, com a farda amarela do colégio toda apertada, e pega num grosso lápis encarnado. "A primeira questão é: "Esta aula é um lugar feliz para eu estar"", lê o professor. Para crianças muito novas, o estudo de Ferguson inclui perguntas ligeiramente diferentes, que professores de outras turmas lêem em voz alta para miúdos em pequenos grupos. A professora de Gerod estava na sala do lado para não influenciar os resultados.

"A minha resposta é "não"", declara Gerod, sorrindo. Os seus ténis, de um branco reluzente, balançam para trás e para a frente. Os outros quatro alunos do grupo marcam "sim". "Esta é muito fácil", anuncia um dos colegas de Gerod.

"Às vezes meto-me em sarilhos na escola", continua a ler a professor.

"Eu digo "sim"", diz Gerod.

Uma auxiliar castiga-o a partir da mesa ao lado. "Não tens que o dizer em voz alta", diz numa voz alta e irritada. "Põe uma resposta!" Mas nenhum dos miúdos parece conseguir conter-se; após cada pergunta, continuam a anunciar as suas respostas a alto e bom som.

"Alguns miúdos aprendem coisas muito mais depressa do que eu."

"Sim", diz Gerod, preenchendo a sua resposta.

"Gosto das coisas que estamos a aprender na aula."

Gerod está a ficar impaciente. "Está na hora do almoço! Está quase?"

É difícil acreditar que o inquérito de Gerod passará o escrutínio científico: alguns dos enunciados estão mal redigidos tendo em conta o seu nível etário e tudo aquilo é obviamente demasiado longo. Mas Ferguson insiste que, do ponto de vista estatístico, as avaliações dos professores pelos alunos do pré-escolar são bastante fiáveis; em milhares de inquéritos, crianças do mesmo jardim-de-infância tendem a concordar umas com as outras sobre os seus professores.

Finalmente, depois de meia hora disto, o professor chega às perguntas demográficas do final do inquérito: "A tua família fala inglês em casa?"

"Nunca", responde Gerod com confiança.

"Tens a certeza, Gerod? Inglês - a língua que estamos a falar agora." Ele muda a sua resposta para "sim".

"Raça ou etnia."

"Branco", diz Gerod, marcando a sua resposta. Ele é negro.

Patricia Wilkins, a educadora de infância de Gerod na Escola Primária de Tyler, recebe os resultados do estudo dois meses depois. Há mais de uma década que dá aulas naquela escola e tem visto muitas reformas vir e passar. Trabalhou para cinco directores diferentes, diz, se incluirmos aquele que foi levado algemado. Mas estava curiosa com os resultados do inquérito. Ao contrário de metade dos professores do projecto-piloto em Washington, ela clicou no link para ver as opiniões dos seus alunos. Ao olhar para os dados, numa pequena sala de reuniões, ficou silenciosa. Depois sorriu. "Tenho a pontuação máxima em Atenção. Era o que eu sentia, mas não sabia o que eles achavam."

Nove dos seus dez alunos disseram gostar da forma como a sua professora os trata quando precisam de ajuda; foi uma nota alta, comparada com a avaliação dos alunos dos jardins-de-infância a nível nacional. Os seus alunos acham também que ela os desafia, o que é reconfortante. Ainda assim, apenas metade disse que os seus colegas se mantinham ocupados e não desperdiçavam tempo. "Isto ajuda muito", disse ela, acenando com a cabeça.

Do outro lado da cidade, na Escola Secundária McKinley, Nubia Baptiste não voltou a ouvir falar do inquérito durante esse ano lectivo. Nesse Verão, a sua professora, Lashunda Reynolds, leu os resultados do estudo aos seus alunos e achou-os justos. "No geral, acho que o inquérito é uma boa ferramenta de reflexão para os professores", disse. Mas está preocupada por alguns alunos a poderem usar de forma tendenciosa a favor ou contra ela, e por isso não quer que os resultados influenciem a sua avaliação formal.

Os directores das escolas também podem ser tendenciosos. E também os testes, como Reynolds bem sabe. Mas, tal como muitos outros professores, parece fatigada por anos de "reformas", umas atrás das outras - e preocupada com uma adição à já longa lista de formas de ser avaliada.

Nathan Saunders, presidente do sindicato de professores de Washington, não parecia estar muito a par do inquérito quando lhe falei nele em Junho. Mas insistiu que os resultados nunca deveriam ser usados para uma avaliação consequente. "Isto tem sido visto por muitos membros do nosso sindicato como mais uma forma de difamar os professores."

Guillaume Gendre, um dos vice-directores de Nubia Baptiste, vê os resultados dos inquéritos de uma forma diferente. "Para mim, é uma informação muito, muito preciosa", disse. Para este teste, ele não pôde ver o nome dos professores ao lado dos seus resultados, para proteger o seu anonimato; mas mesmo assim considera a informação mais útil do que aquela que é dada pelos testes habituais.

No geral, os professores ficaram acima da média das avaliações das escolas secundárias nacionais. Mas as variações dentro da escola foram desconcertantes. Nas categorias de Controlo e Desafio - as áreas que importam mais na aprendizagem -, Nubia e os seus colegas deram a diferentes professores pontuações muito distintas. Para Controlo, que reflecte o quão ocupados e bem-comportados, os alunos estão numa sala de aula, as notas dos professores foram de 16% a 90%; para Desafio, a avaliação foi de 18% a 88%. Alguns professores eram claramente respeitados pela sua capacidade de explicar matérias complexas ou em ocupar os alunos com uma tarefa, enquanto outros pareciam maçá-los de morte.

Os resultados ajudaram Gendre a perceber por que razão oito em cada dez alunos da McKinley que fizeram os testes Advanced Placement [exames anuais] não passaram. Na resposta a uma das questões do inquérito - "O meu professor não deixa as pessoas desistirem quando o trabalho se torna difícil" -, menos de um terço dos estudantes respondeu "Concordo totalmente". "Este sítio precisa de se tornar mais desafiante do ponto de vista académico, e os alunos precisam de se sentir mais valorizados e apreciados", concluiu Gendre, olhando fixamente para os resultados impressos no seu escritório na última semana de aulas.

Este ano, Washington tornará o inquérito acessível a todos os directores e professores que o quiserem usar. A responsável Kaya Henderson diz que no próximo ano o inquérito poderá contar para as decisões sobre salários e despedimentos. Mas para já ela quer avançar com cautela, depois de anos de mudanças turbulentas nas escolas da capital. "Temos de o fazer bem", diz. "Caso contrário, irá arrasar com as nossas hipóteses de o voltar a fazer."

A versão mais curta do inquérito, utilizada no estudo da Gates, está acessível para uso público e custará menos de cinco dólares [3,8 euros] a executar. É uma pechincha incrível. Os testes normalizados de Washington e a sua análise detalhada custam mais de 35 dólares por aluno; contratar profissionais para assistir a aulas e dar o feedback aos professores várias vezes ao ano custa cerca de 97 dólares por aluno.

Mas muitos agrupamentos investiram demasiado nas análises aos resultados académicos para lhes virar agora as costas. Aqueles que vierem a adoptar os inquéritos aos alunos irão certamente adicioná-los à informação de testes e observações de aulas para criar uma forma mais equilibrada (e ainda mais complicada) de medir o desempenho dos professores.

Quando liguei a Nubia Baptiste no Verão com os resultados dos inquéritos, ela não ficou surpreendida. "Todos sabem distinguir os bons professores daqueles que não querem verdadeiramente estar na profissão", disse ela. Quando comecei a descrever a enorme variação entre os professores, ela interrompeu-me. "Eu vivi essa dinâmica."

Nubia estava a caminho da Temple University, onde punha a hipótese de estudar Ciências ou Engenharia. Tendo testemunhado pessoalmente muitas das reformas recentes, estava alerta para o que mais interessava. "Não quero saber dos resultados", disse ela. "Quero saber das mudanças que os resultados trazem. Se eu voltar daqui a cinco anos e uma porcaria de professor estiver ainda sentado na porcaria da secretária, então para que serviu o estudo?"

aExclusivo PÚBLICO / The Atlantic

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