O candidato que já ganhou por ter ido até ao fim

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Fernando Nobre

O médico chega ao final da campanha a afirmar-se como o precursor de uma nova forma de fazer política, agora despida dos espartilhos partidários

O balanço da campanha de Fernando Nobre só se poderá fechar quando, no dia 23, se fizerem as contas à abstenção. Nas duas últimas semanas, o candidato independente dedicou boa parte das suas intervenções a tentar chegar ao coração dos abstencionistas crónicos, dos cépticos e dos desiludidos do sistema. O sucesso da sua candidatura só poderá assim ser aferido, quando se perceber se conseguiu ou não reduzir o abstencionismo, que, nestas eleições, surge agravado pelo clima de favas contadas que se instala sempre que o Presidente em exercício se recandidata.

No arranque da campanha, as sondagens colocavam Nobre na fasquia dos cinco por cento, o que estava longe de fazer sombra a Manuel Alegre. As últimas sondagens, porém, já o apresentam como o terceiro candidato mais votado. Independentemente da aritmética, Fernando Nobre garantia ontem que já ganhou. "É a primeira vez que um cidadão como eu, sem nenhum passado político e sem nunca ter desempenhado nenhuma função governativa, consegue levar a sua candidatura até ao fim. É um facto histórico em Portugal e isso já consegui, já ninguém me tira."

O que se joga nesta candidatura é também perceber se ela funcionou ou não como embrião de uma nova forma de fazer política fora dos espartilhos partidários. Afinal, Nobre apresenta-se como percursor de um movimento novo com capacidade para demonstrar que os cidadãos são capazes de chamar a si o poder de decisão. "Eu abri uma porta. Essa porta está aberta e o futuro demonstrará que outros se seguirão", disse ontem, em Almada.

Mas não se pense que o médico - que para muitos e em poucos meses passou de figura incontestável a demagogo e populista ? já assumiu a derrota. Pelo contrário, ontem à tarde, Nobre continuava a tentar acantonar Alegre e a extravasar indignação por causa das declarações de Cavaco quanto aos custos de uma eventual segunda volta para o país. "Pergunto-me se a democracia tem preço", reagiu, na recta quase final de uma campanha que ficou marcada por alguns excessos verbais, como quando disse que só um tiro na cabeça o impediria de chegar a Belém.

Para a rua, a mensagem que passou parece ter sido a de um homem pouco dado à maldicência politiqueira. "Por sua causa, voltei a acreditar no sistema", confidenciou-lhe um homem em Setúbal. "Só por isso", retorquiu Nobre, "já valeu a pena."

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