UE arrisca credibilidade, se não intensificar ajuda ao desenvolvimento

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Ajuda aos países mais pobres não deve ser vista como caridade CARLA CARVALHO TOMáS

Os Vinte e Sete são os principais promotores de apoio directo aos países mais pobres, mas mesmo assim estão a falhar as metas que se tinham proposto

Os países da União Europeia (UE) vão ter de intensificar os esforços para cumprir as promessas de ajuda ao desenvolvimento que fizeram aos países mais pobres, de preferência através da adopção de objectivos vinculativos, sob pena de perderem a credibilidade face ao resto do mundo.

O aviso foi feito em entrevista ao PÚBLICO por Andris Piebalgs, comissário europeu responsável pela política de desenvolvimento da UE, no momento da apresentação de um plano de acção destinado a reforçar a credibilidade da política europeia em favor dos países mais vulneráveis.

Paradoxalmente, os Vinte e Sete são os maiores fornecedores de ajuda ao desenvolvimento - com 48 mil milhões de euros por ano, ou 0,42 por cento do rendimento nacional bruto (RNB) - sobretudo quando comparados com os 0,2 por cento do RNB dos Estados Unidos. "[Porém], frisa o comissário, "por causa dos compromissos que assumimos, poderemos ser vistos como os que não estão a cumprir."

O problema está em que a UE no seu conjunto está longe de atingir os 0,7 por cento do RNB que prometeu consagrar ao desenvolvimento em 2015, e mesmo os 0,56 por cento em 2010 que definiu como etapa intermédia para chegar ao objectivo final.

Só com uma estratégia comum, declinada em planos nacionais "credíveis" é que a UE poderá apresentar-se em posição de força na conferência das Nações Unidas do fim de Setembro, em Nova Iorque, consagrada à avaliação dos progressos realizados no cumprimento dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM). Definidos em 2000, estes objectivos visam a redução da pobreza, de doenças como a malária e a sida e o aumento da educação e da saúde.

Piebalgs acredita que é possível os governos cumprirem as promessas através dos orçamentos de Estado, frisando que mesmo em tempo de crise vários países aumentaram o nível da ajuda. Sobretudo porque o mais difícil já está feito, enfatizou: para cobrir os 0,28 por cento do RNB que faltam para cumprir a meta fixada para este ano, os Vinte e Sete precisam de disponibilizar 9 mil milhões de euros. "Os montantes não são astronómicos e são atingíveis, mas é mais uma questão de vontade política de que de orçamentos de Estado", considera.

Portugal consagrou no ano passado 364 milhões de euros, ou 0,23 por cento do RNB, ao desenvolvimento, o que representou uma quebra de 15,7 por cento face aos valores de 2008, ano em que chegou aos 0,27 por cento do RNB. Segundo Pielbalgs, o país precisaria de consagrar 160 milhões por ano para atingir a meta de 2015.

O comissário defende, por outro lado, que esta ajuda não deverá ser encarada com mera "caridade", mas sobretudo como "investimento": se a economia crescer, se tiverem boa governação e garantirem condições estáveis de investimento, estes países proporcionarão enormes oportunidades de crescimento económico" para a Europa, considera.

Entre os Vinte e Sete, quatro países não só já cumpriram a meta de 2010, como ultrapassaram a de 2015: Suécia, Dinamarca, Holanda e Luxemburgo. A Bélgica, Irlanda, Finlândia, e Reino Unido estão, por seu lado, muito próximos do objectivo intermédio de 2010.

No extremo oposto, entre os membros mais antigos da UE (os novos Estados do Leste têm objectivos menos ambiciosos), a Itália está no fundo da tabela, com apenas 0,16 por cento do RNB.

Fontes alternativas

O comissário letão defende, por outro lado, que os Vinte e Sete deverão começar a pensar em fontes alternativas e "inovadoras" de financiamento da política de desenvolvimento, de modo a aumentar a sua credibilidade e previsibilidade. A sua preferência vai para um sistema global, ou no mínimo europeu, e vinculativo.

Algumas das possibilidades que têm sido referidas passam por uma parte do produto de uma taxa sobre as transacções financeiras internacionais (a chamada "taxa Tobin"), de um imposto sobre os carburantes, ou mesmo das multas impostas por Bruxelas às empresas que violam as regras da livre concorrência. É uma discussão que levará tempo para ser decidida e aplicada, reconhece, defendendo que, qualquer que seja o sistema adoptado, o importante é que uma parte clara e visível seja canalizada para o desenvolvimento.

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