Ministério Público pediu prisão de Isaltino Morais duas vezes desde Novembro

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Isaltino foi condenado nos tribunais a dois anos de prisão efectiva PEDRO CUNHA

Processo regressou anteontem ao Tribunal de Oeiras e já nada impede a juíza de decidir se manda prender o autarca. A questão está em saber se parte dos crimes já prescreveu

O Tribunal de Oeiras deverá decidir dentro de dias se o procedimento criminal contra Isaltino Morais prescreveu parcialmente a 4 de Novembro, como diz o arguido, ou se o manda prender, como já pediu o Ministério Público (MP) por duas vezes desde Novembro. A decisão só agora será tomada porque só anteontem chegaram a Oeiras os autos relativos ao acórdão de 14 de Dezembro em que o Tribunal da Relação de Lisboa mandou a juíza titular do processo avaliar se houve ou não prescrição, ou seja, se foram excedidos os prazos máximos previstos na lei para que Isaltino possa cumprir a pena de dois anos de prisão efectiva a que foi condenado.

O autarca sustenta que a prescrição de um dos dois crimes de fraude fiscal - a condenação abrange também um crime de branqueamento de capitais - ocorreu a 4 de Novembro passado, pelo que não terá de cumprir a parte da pena correspondente a esse crime, conforme consta do processo que o PÚBLICO consultou nos últimos dias. Contrariamente ao arguido, o MP entende que a sentença condenatória transitou em julgado dias antes, tornando-se irreversível e não havendo qualquer hipótese de prescrição. Por isso mesmo, o procurador Luís Eloy requereu à juíza Carla Cardador a emissão de mandados de detenção contra o autarca em 9 de Novembro e, novamente, em 30 de Novembro.

Juíza de mãos atadas

Em ambas as ocasiões, a magistrada decidiu adiar a sua decisão para depois de se tornar definitivo o acórdão da Relação que rejeitou o pedido do arguido para afastá-la do processo - facto que ocorreu em 29 de Novembro. A juíza tem-se mantido, no entanto, em silêncio, por ter estado a aguardar a chegada ao tribunal dos autos relativos a dois outros recursos de Isaltino, os quais foram decididos pela Relação em acórdãos de 14 de Dezembro, mas só anteontem "baixaram" a Oeiras.

Num desses acórdãos, os desembargadores indeferem o pedido de revogação do despacho que atribuiu "carácter urgente" ao processo. No outro, o principal, é dada razão ao arguido, ordenando-se a apreciação pelo Tribunal de Oeiras da prescrição por ele alegada desde Maio, sem qualquer referência ao dia 4 de Novembro. Na origem desse recurso esteve o facto de a juíza se ter recusado em Setembro a decidir se já tinha ou não havido prescrição, por entender - desconhecendo que havia um outro recurso pendente no Tribunal Constitucional (TC) - que a condenação do arguido já tinha transitado em julgado e ordenando a sua detenção, que durou menos de 24 horas.

A "baixa" dos autos destes dois recursos só agora se verificou - embora uma cópia dos acórdãos tivesse sido enviada para Oeiras logo a 14 de Dezembro - devido ao facto de terem estado a correr os prazos para uma eventual reclamação, os quais suspenderam durante as férias judiciais, entre 22 de Dezembro e 3 de Janeiro. Terá sido esse facto que levou a juíza a não se pronunciar até hoje sobre os requerimentos em que Luís Eloy pede a prisão de Isaltino Morais.

No primeiro, de 9 de Novembro, dia seguinte à data do acórdão que indeferiu o pedido de afastamento da juíza, o representante do MP sustenta que a sentença já transitou em julgado. Nesse mesmo dia, Isaltino alega, contudo, que o tribunal não se pode pronunciar sobre a sua prisão enquanto não forem definitivamente decididos os incidentes referentes ao afastamento da juíza (cujo acórdão da véspera era ainda passível de reclamação) e à apreciação da prescrição.

No segundo pedido à juíza para prender Isaltino, o procurador já é peremptório, ao afirmar, a 30 de Novembro, que "o acórdão condenatório transitou em julgado, de forma incontroversa, no dia 31 de Outubro", data em que o TC rejeitou o último recurso ali interposto pelo autarca, e manifesta inclusive algum desagrado por, "decorridos mais de 20 dias sobre a promoção da emissão de mandados de detenção, e não obstante tratar-se de processo declarado urgente", não existir ainda qualquer decisão. No contraditório, Isaltino argumentou que a "condução à cadeia" só pode ser ordenada "quando não subsistirem questões por decidir".

Uma questão de dias

É sobre estas duas questões - a prescrição e a prisão de Isaltino - que a juíza terá agora de se pronunciar. Caso venha a confirmar a tese de que a prescrição aconteceu a 4 de Novembro, a questão essencial está em saber se, nessa altura, a condenação tinha transitado em julgado, o que retiraria qualquer efeito à prescrição.

Pelo sim e pelo não, Isaltino já jogou um trunfo complementar, requerendo a junção aos autos da notificação que lhe foi feita pelo TC, relativa ao acórdão de 31 de Outubro. O documento tem data de 2 de Novembro mas, nos termos da lei, a notificação só é considerada feita três dias úteis depois, ou seja, a 7 de Novembro. Ora, alega o autarca, "nos casos em que seja fixado o trânsito em julgado, a decisão que o determinar apenas pode operar os seus efeitos [...] com a notificação da mesma ao arguido". Dito de outro modo, a defesa de Isaltino aposta em que, mesmo que seja considerado que o trânsito em julgado resulta do acórdão de 31 de Outubro, este só produz efeitos em 7 de Novembro, ou seja, três dias depois da alegada prescrição.

"Saber se transitou ou não a 31 de Outubro, e se prescreveu ou não, depende da leitura, são questões de direito, e aí cada cabeça sua sentença", disse ao PÚBLICO um juiz desembargador. Em qualquer dos casos, acrescentou, dessa decisão caberá sempre recurso para a Relação.

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