Bruxelas obriga a reduzir ajudas às fábricas da Embraer

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Sócrates e Lula apadrinharam acordo para as unidades FRANCISCO LEONG/ AFP

Apesar das reservas levantadas ao projecto de Évora, as autoridades portuguesas acreditam na aprovação a curto prazo

O projecto do fabricante de aviões Embraer, para a construção de duas fábricas em Évora, aguarda há mais de um ano e meio por uma luz verde da Comissão Europeia. Em causa estão dúvidas sobre o investimento envolvido e as ajudas de Estado, ao abrigo das regras europeias de concorrência.

O assunto vai ser amanhã abordado em Bruxelas, numa reunião em que à mesma mesa irão estar representantes da AICEP Portugal Global, da Embraer e da Direcção-Geral de Concorrência. A expectativa portuguesa é a de que o processo possa receber uma decisão favorável, nas próximas semanas, embora com um nível global de incentivos 10 por cento abaixo do inicialmente previsto, apurou o PÚBLICO.

Entre Agosto de 2008 e o início de 2010, a Comissão Europeia pediu por quatro vezes informações ao Governo sobre o projecto. As dúvidas, à luz do direito da concorrência, têm sido várias e as correcções já introduzidas ao longo das discussões também.

Uma das principais questões teve a ver com o apoio a duas fábricas num mesmo local: Bruxelas quis ter a certeza de que não se tratava de um mesmo projecto artificialmente dividido por dois para assim beneficiar indevidamente de mais incentivos do que o limite legal. Essas dúvidas terão sido já resolvidas.

Em cima da mesa estão 170 milhões de euros de investimentos previstos para a construção das duas unidades e incentivos públicos de cerca de 44 por cento do total: ascendem a 76,5 milhões de euros, incluindo fundos concedidos pelo QREN e benefícios fiscais para o grupo brasileiro.

A construção das duas fábricas da Embraer é um dos principais projectos de investimento estrangeiro que o Governo tem em calendário no âmbito do QREN (Quadro de Referência Estratégico Nacional), que irá estar em vigor até ao final de 2013.

Em causa está a instalação em Évora da maior unidade portuguesa de montagem de estruturas metálicas para aviões, baptizada como E Operacional Estruturas Metálicas, e também de uma unidade de produção de conjuntos em materiais compósitos, a Estruturas em Compósitos, ambas para fornecerem jactos executivos da Embraer.

Basílio Horta, presidente da AICEP-Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal, defende que "foi tudo notificado a Bruxelas" e que "a aplicação do dinheiro não excede em nada as boas regras da concorrência". "Temos esperanças fundamentadas de que as coisas fiquem desbloqueadas a curto prazo", sublinhou o responsável do organismo que coordena o investimento estrangeiro. Trata-se de um dos processos mais longos e mais difíceis de negociar que a administração já defendeu, mas o facto não é tido como excepcional. Para vários especialistas, é até compreensível o extremo rigor com que Bruxelas o tem avaliado, dada a sua dimensão e o sector sensível em que se inclui, da aeronáutica de médio porte.

A convicção das autoridades é a de que o processo estará perto do fim e que a decisão será favorável. A própria Embraer estará já preparada para receber menos 10 por cento de ajudas do que esperava, em resultado das correcções. "Não é dramático", defende um dos elementos que conhecem este tipo de negociações e face ao que têm sido os remédios impostos por Bruxelas para outros casos.

Há uma semana, Portugal terá recebido a última carta de questões em aberto. "Estamos esperançados que esta seja a última reunião, conclusiva, e que permita uma decisão positiva para os investimentos da Embraer", disse ao PÚBLICO o gestor do Programa Operacional Compete (ex-Prime), Nélson de Sousa. Este responsável, que se escusa a comentar a eventual redução dos incentivos, sublinha que foi uma discussão "muito exigente do ponto de vista técnico, mas à qual o país respondeu sempre com prontidão".

Nos bastidores, duas razões são especialmente apontadas para o rigor com que a CE tem analisado este projecto. Uma primeira razão será irónica para a própria Embraer. As várias reclamações que o fabricante aeronáutico apresentou em Bruxelas, no passado, por se sentir lesado pelos apoios públicos concedidos a outras empresas, acabaram por jogar contra a própria. A Comissão usou essa informação para aferir a conformidade deste mesmo projecto com a lei.

Outra razão, não explícita, "nunca formal" e alegadamente ultrapassada desde o início foi o facto de se tratar de uma empresa não europeia - apesar de ter constituído uma firma de direito comunitário para este projecto - a pretender apoios num sector industrial complexo para a UE como é a indústria aeronáutica.

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