Belém apoia imposto extra sobre altos rendimentos e exclui bens patrimoniais

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Proposta do Governo poderá estar em linha com ideias de Cavaco Silva Miguel Manso

Governo poderá debater proposta no próximo Conselho de Ministros, mas o PS terá iniciativa pronta no início da semana. BE relança hoje projecto de imposto sobre as grandes fortunas

O Presidente da República vê com satisfação a possibilidade de o Governo avançar com a criação de um imposto especial sobre os altos rendimentos. O PÚBLICO sabe que em Belém a notícia de que o executivo pondera suscitar o debate sobre o assunto quando for analisado o Documento de Estratégia Orçamental foi recebida com agrado, uma vez que a proposta de um imposto extra aplicável a rendimentos elevados, em sede de IRS, coincide com aquilo que Cavaco Silva defendeu durante a campanha eleitoral para as presidenciais de Janeiro.

A ideia então explicada pelo Presidente numa entrevista à Rádio Renascença mantém-se inalterável, nota fonte da Presidência. Nessa entrevista, transmitida dois dias antes das eleições de 23 de Janeiro, Cavaco sublinhou que, em alternativa ao corte de salários, o Governo PS deveria ter solicitado "o contributo de todos os cidadãos". "Bastava, por exemplo, que fosse criado um imposto extra para todos os portugueses acima de um certo rendimento", afirmou, acrescentando que "os sacrifícios exigidos nos últimos tempos não se dirigem a todos os portugueses".

A preocupação de Cavaco na concretização de medidas que traduzam uma justa distribuição de sacrifícios sustenta, por isso, a sua atenção sobre a iniciativa que o Governo poderá apresentar daqui a alguns dias. No Conselho de Ministros da próxima semana, o executivo poderá discutir já uma proposta concreta, prevendo-se que, à semelhança do que foi defendido por Cavaco, a nova tributação seja feita em sede de IRS, excluindo os bens patrimoniais.

A título pessoal, Guilherme Silva, deputado do PSD e vice-presidente da Assembleia da República, considera que "faz mais sentido em sede de IRS", notando que está já prevista uma actualização da taxação sobre o património, "embora englobe todos". Do outro partido da coligação, o CDS, ninguém quis comentar o tema.

O PS, numa tentativa de antecipar a iniciativa do Governo, está a trabalhar em ritmo acelerado na procura de uma solução. Ontem, poucas horas depois de a direcção do PS anunciar, através de um comunicado, que António José Seguro tinha pedido à bancada parlamentar propostas para taxar os rendimentos de capital, alguns deputados socialistas reuniram-se num encontro preparatório.

O objectivo é, sabe o PÚBLICO, apresentar uma proposta na segunda ou terça-feira. E, por ora, o leque de soluções é vasto: um pacote de medidas transitórias; a recuperação do projecto de abranger os dividendos na aplicação do novo imposto sobre o subsídio de Natal; taxação sobre os bens patrimoniais; contribuição especial sobre os rendimentos. "Está tudo em aberto", diz um deputado ao PÚBLICO, apontando que o momento é propício a uma discussão aprofundada sobre a distribuição de rendimentos e o PS poderá travar, nesse campo, um eficaz combate político.

Por seu lado, o PCP aguarda pela proposta do Governo, esperando que esta não seja "apenas uma medida decorativa", frisou o deputado Paulo Sá.

BE lança imposto "solidário"

Esta manhã, a partir das 11h, o líder parlamentar do Bloco de Esquerda (BE) vai apresentar a sua proposta de um "imposto de solidariedade sobre as grandes fortunas". O projecto de lei recupera a maioria das ideias já defendidas pelos bloquistas em 2009 e defende a taxação sobre elevados rendimentos e sobre bens patrimoniais mobiliários e imobiliários.

Notando que Portugal é o país da União Europeia com maior desigualdade de rendimentos, o BE evoca os exemplos positivos da Espanha, França, Finlândia, Luxemburgo, Holanda, Áustria, Suíça e Suécia onde este imposto foi aplicado há vários anos. Para o BE, a nova contribuição deverá incidir sobre os indivíduos cuja fortuna seja superior a 2500 salários mínimos - um valor que corresponde a 1.212.500 de euros.

De acordo com o projecto bloquista, consideram-se para o valor do património global os valores mobiliários, os créditos de natureza diversa, os instrumentos de poupança, as propriedades imobiliárias, os meios de transporte, "cavalos, gado e outros animais com valor determinável no mercado" e ainda ouro, prata e metais preciosos (exceptuando objectos de arte ou de colecção).

A proposta prevê, contudo, que alguns bens fiquem isentos, nomeadamente aqueles que podem ser considerados do foro privado, como jóias de família, obras de arte, antiguidades, objectos de colecção, direitos de propriedade literária ou artística, valores das pensões de reforma, rendimentos provenientes de indemnizações por danos corporais ou acidente, a habitação principal (caso esteja a ser paga por empréstimo contraído num prazo máximo de 20 anos), créditos litigiosos e indemnizações laborais.

No capítulo das taxas progressivas, o BE propõe 0,6% para valores patrimoniais entre 2500 e 3000 salários mínimos, 0,8% (entre 3000 e 4800), 1% (entre 4800 e 8000) e 1,2% (mais de 8000).

Contudo, para impedir que se assista um agravamento da tributação, o somatório dos impostos a liquidar (imposto de solidariedade e IRS) não pode ser superior a 70% do rendimento anual.

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