Centro comercial reinventou-se para fazer frente à concorrência

Foto
miguel madeira

Inaugurou uma época, quando nem havia legislação para espaços tão grandes. A concorrência obrigou-o a reposicionar-se. Luxo é a palavra-chave

a Dizia-se que Lisboa não aguentava um centro comercial assim. No início dos anos de 1980, aos olhos dos críticos, o shopping center das Amoreiras era "megalómano" e corria até o risco de falir. Mas o tempo deu razão aos promotores. Um quarto de século depois, o modelo de negócio inaugurado pelo Amoreiras vingou e inspirou outros centros comerciais, que lhe fizeram concorrência. Em resposta, o Amoreiras apontou baterias à classe média alta. Hoje, há lojas de luxo que, em Portugal, só se encontram ali.

Desde 2007 que a Mundicenter, proprietária do complexo, tenta agarrar com unhas e dentes os clientes. Depois de ter perdido sobretudo a faixa de consumidores mais jovens com a abertura do Colombo, não cruzou os braços após as obras do túnel do Marquês (entre 2003 e 2007), que provocaram uma quebra acentuada de visitantes. "Nessa altura houve um volte-face, visível no mix que o centro oferece agora aos clientes", explica Sandra Campos, directora de retalho em Portugal da Cushman & Wakefield, consultora imobiliária envolvida no reposicionamento do centro comercial.

A aposta no alargamento de algumas lojas permitiu "responder às necessidades dos retalhistas", diz Sandra Campos. Na tentativa de oferecer uma alternativa atraente às marcas de luxo, "em algumas zonas do shopping, a Mundicenter concentrou a oferta dirigida ao público de classe mais alta", afirma Carlos Récio, director associado da consultora CB Richard Ellis. Nessas zonas mais "elitistas" estão lojas de marcas como a Guess, a Hugo Boss, a Loja das Meias (que não está em mais nenhum shopping de Lisboa) e a francesa Tara Jarmon, que tem ali a única loja em Portugal. "Como a Avenida da Liberdade, também o Amoreiras apostou no mercado de luxo, para se diferenciar do Colombo", nota Teresa Barata Salgueiro, investigadora do Centro de Estudos Geográficos da Faculdade de Letras de Lisboa. Mas nem por isso afastou a classe média baixa, que encontra no Amoreiras as populares Bershka, Mango ou Parfois, entre outras. No total, são 250 lojas.

Hoje, o shopping recebe cerca de 11 milhões de visitantes por ano. A ausência de uma linha de metro nas imediações acaba por fazer a "triagem", admite António Sampaio de Mattos, presidente da Associação Portuguesa de Centros Comerciais (APCC). E quem lá vai agradece. "Prefiro este centro porque é mais calmo e tem as lojas de que preciso", explica uma cliente de 88 anos, que, ali, não se perde entre as lojas.

Apesar de assinalar o sucesso do projecto, Sampaio Mattos, que foi director comercial da Mundicenter de 1983 a 1989, lembra que foi árdua a tarefa de explicar aos comerciantes, "de A a Z", o que era um grande centro comercial. Era tudo novo na altura. Nem sequer havia legislação para regular o funcionamento de um espaço do género. Mas o esforço valeu a pena. A imprensa de então revela que na véspera da inauguração estavam contratados mais de 85 por cento dos espaços, em quase 300.

"Sabíamos que era uma experiência que ia ditar o futuro", recorda Sampaio Mattos, sublinhando que "há um antes e um depois do Amoreiras" na forma de fazer comércio na capital e no país. Até a concorrência o reconhece. O Amoreiras marcou, na opinião de Artur Soutinho, administrador executivo da Chamartín Imobiliária, "o momento de arranque do negócio dos centros comerciais" em Portugal. "Novidade, comodidade e variedade de serviços disponíveis num mesmo espaço" foram o segredo para o sucesso, admite o responsável da empresa que detém os Dolce Vita.

Com o Amoreiras, os lisboetas ganharam um novo hábito: ir passear para o centro comercial. Criou-se um novo "passeio público", para compras nas lojas ou no supermercado, ver exposições, ir à missa, comer ou ir ao cinema. É "a cidade dentro da cidade", que o jingle de rádio anunciava nos primeiros tempos de vida do Amoreiras. com Ana Rute Silva

Sugerir correcção