CARTAS À DIRECTORA

A greve geral

A greve foi apenas mais um episódio na luta profunda entre o grande capital e o trabalho.

Houve banqueiros e especuladores que lançaram os países numa crise gravíssima e quem está a sofrer os seus efeitos é fundamentalmente a classe mais desprotegida, trabalhadores de baixos salários e desempregados.

O primeiros, em geral, continuam impunes, puseram a salvo o seu dinheiro e até são protegidos, pois as medidas dos governos quase nem os beliscam. Entretanto, os juros da dívida continuam a subir.

O nosso Governo sente-se entalado entre: 1) o trabalho empobrecido; 2) as classes influentes e desafogadas que só pensam nos seus interesses; e 3) os partidos que o atacam para chegarem ao poder.

O vector 1 tende a ser esmagado pelos outros dois. No meio, o Governo procura sobreviver politicamente.

No fundo, quem se preocupa com o interesse nacional?

Anónio Catita, Lisboa

Cunhal e Salazar

Cunhal voltou, outra vez, a ser notícia. Desta vez, para se saber que ele foi um homem normal, como qualquer cidadão - amou, casou e teve uma filha.

Longe vão os tempos (do PREC) em que ele era venerado pelos seus seguidores e temido e odiado pelos seus inimigos.

Odete Santos disse um dia que Cunhal era o oposto de Salazar. O que não é verdade. Entre ambos havia mais semelhanças do que diferenças. Ambos eram ditadores, ambos queriam o poder: um conservando-o, outro ambicionando-o. Ambos viveram sem as luzes da ribalta e ambos viviam e vestiam sem espaventos. Nenhum gostava de se pavonear. Nenhum deles mostrou sinais exteriores de riqueza. Nem um, nem outro, gostavam de exibir os carros em que se faziam transportar. Eram homens pouco acessíveis e só uma pequena nata de privilegiados se acercava e tinha trato com eles. Nem um nem outro se misturaram com o povo, não iam a festas mundanas, nem frequentavam restaurantes. Nutriam um pelo outro um ódio de estimação. Eram ambos muito determinados e batiam-se com denodo pelas ideias e ideais em que firmemente acreditavam. Cunhal viveu na clandestinidade, Salazar viveu enclausurado, outra espécie de clandestinidade, em S. Bento. Ambos morreram pobres. Ambos tiveram um funeral VIP, digno e muito participado.

Claro que havia diferenças: Salazar defendia a sua pátria e nunca pensou em desfazer-se, por qualquer preço, das colónias que considerava partes integrantes da mãe-pátria. Cunhal era um defensor da URSS e seguia a sua ideologia totalitária, ganhando com isso muito conforto, protecção, notoriedade e outros privilégios. Era inimigo de Salazar, o que significava ser inimigo de Portugal. Eu não sei se, invertidos os papéis, Cunhal pouparia a vida a Salazar, como este a poupou àquele.

Durante o PREC Cunhal tudo fez para destruir Portugal e as suas estruturas produtivas.

A política fez de Salazar um estadista importante, para o bem e para o mal. Cunhal teria sido um homem bom, e um artista, a política é que lhe não deu condições para desenvolver estas qualidades que, aliás, demonstrou na última parte da sua vida.

Eu fui um daqueles muitos que detestava Cunhal, mas reconheço que era um homem bom e admirei sempre a sua arte, como escritor e como desenhista. E a sua inteligência e finura política.

E, para concluir: Cunhal retirou-se antes de deixar este mundo. Salazar mostrou sempre o seu excessivo apego ao poder, que só largou com a morte física.

Artur Gonçalves, Rio de Mouro

Caimões e camaleões

Leio no Expresso que, em 2009, saíram de Portugal 2600 milhões de euros de investimentos em acções, obrigações e outros activos financeiros para o escolhido paraíso fiscal das ilhas Caimão. Já lá estão quase 13 mil milhões de euros, uma percentagem significativa do nosso Produto Interno Bruto (PIB), e escreve o Expresso que foram "os portugueses" que lá o colocaram. Pergunto ao Expresso: quais portugueses? Aqueles que ganham mais de 40 mil euros/mês? Os donos de Portugal? Aqueles que dançam do Governo para as empresas públicas e nada investem nas instituições de solidariedade social? E os grandes accionistas de grandes empresas e os seus dividendos que nada pagarão de impostos este ano? Quem são? E para onde vai o seu excedente em dinheiro? Ninguém sabe, nem pode saber.

Com estes camaleões que nos dominam e governam, Portugal apenas consegue mudar de cor, conforme o galho em que eles se penduram.

José Raimundo Correia de Almeida, Lisboa

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