Medidas deixam ministros britânicos apeados

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O Governo de Cameron foi mais longe que outros países europeus LEON NEAL/AFP

À excepção das principais figuras do Governo, os outros ministros passam a deslocar-se de metro, comboio ou a pé

"A era da abundância acabou. Bem-vindos à era da austeridade." Não fosse o tema tão antipático e a ironia poderia bem ter sido usada por George Osborne, o ministro das Finanças britânico, quando na segunda-feira anunciou as primeiras medidas para redução do défice. E se o Reino Unido não foi o primeiro a lançar-se na árdua tarefa, foi mais longe do que qualquer país europeu nas medidas para limitar os gastos do Governo e dos seus gabinetes.

"Os ministros deverão andar a pé ou usar transportes públicos", anunciou o director do Tesouro, o liberal-democrata David Laws, explicando que os membros do Governo e directores dos serviços vão deixar de ter carro e motorista atribuído. Quando o comboio ou o metro não forem alternativa para deslocações de serviço, os dirigentes poderão recorrer aos Jaguar da frota executiva, "mas sempre que possível" partilhando-os com outro(s) colegas.

Por razões de protocolo e segurança, as novas regras não vão abranger as caras mais conhecidas do Governo (o primeiro-ministro e o seu vice, os ministros da Defesa, Negócios Estrangeiros, Interior e Finanças), ainda que Cameron seja um conhecido adepto da bicicleta e insista em percorrer a pé as ruas que ligam o seu gabinete, em Downing Street, ao Parlamento, para desagrado dos guarda-costas.

Ao deixar os ministros apeados, o Governo poupa aos cofres públicos cinco milhões de libras (5,7 milhões de euros), uma gota de água no oceano de 156 mil milhões de libras do défice actual. Mas Osborne e o seu "número dois" sabem que será impossível impor ao país as medidas de austeridade se os políticos, desacreditados pelo escândalo das despesas, "não pagarem a sua parte".

Não espanta, por isso, que um sexto das poupanças anunciadas esta semana (mais de 1150 milhões de libras) resulte da eliminação de "despesas discricionárias" dos ministérios e departamentos governamentais. A admissão de novos funcionários foi suspensa, qualquer salário superior ao do primeiro-ministro terá de ser aprovado pessoalmente por Laws e o mesmo acontece com a contratação de assessores e consultores. E estes não são valores desprezíveis - segundo o Guardian, a Administração estava a gastar, por ano, 1500 milhões de libras só em consultadoria.

Mas a era de austeridade não será apenas sentida pelos ministros. Os funcionários da Administração deixarão de poder viajar em primeira classe e as deslocações, dentro e fora do país, vão ser alvo de um controlo mais apertado, o que permitirá reduzir os 320 milhões de libras gastos em 2009 em hotéis, os 70 milhões despendidos em aviões ou os mais de três mil milhões para comparticipação de viagens. E mesmo o recurso a táxis será limitado - a factura elevou-se só em 2009 a mais de 125 milhões de libras.

Laws, que enquanto número dois das Finanças tem nas mãos o machado para cortar as despesas, admitiu que estas são "medidas draconianas", mas sublinhou que só sendo inflexível e "criando ondas de choque" será possível pôr fim ao despesismo.

O Guardian escreveu esta semana que muitas destas das restrições vão desagradar aos recém-empossados, alguns dos quais passaram os últimos 13 anos invejando as limusinas e os luxos do Labour. Mas Osborne foi muito claro quando explicou as novas regras: só cortando a direito nos gastos supérfluos, a coligação conseguirá manter o compromisso eleitoral de não reduzir os orçamentos da Saúde e Educação. Por isso, ironizava o diário londrino, ninguém deverá ficar espantado quando requisitar um carro e receber como resposta: "Senhor ministro, peço desculpa mas vai ter de ir de metropolitano".

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