Directores procuram mecenas para dar prémio aos melhores alunos do secundário

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"As propinas são caras e era uma grande ajuda", lamenta Liane Henriques SéRGIO AZENHA

As escolas ganham meio milhão de euros com a suspensão do prémio de mérito escolar de 500 euros mas não se conformam com a opção do Ministério da Educação

Ao suspender a entrega dos prémios individuais de 500 euros aos melhores dois alunos das 464 escolas secundárias do país, o Ministério da Educação (ME) conseguiu canalizar para os respectivos estabelecimentos de ensino perto de meio milhão de euros. Mas nem por isso os representantes das associações de directores se mostram satisfeitos. Alguns procuram mecenas que se substituam ao Ministério da Educação no pagamento daqueles montantes aos alunos distinguidos, entre os quais, avisam, "estão muitos carenciados".

Ontem, o ministro da Educação, Nuno Crato, desvalorizou o facto de a informação sobre a suspensão do prémio só ter chegado às escolas das regiões norte e Lisboa e Vale do Tejo anteontem, a três dias da cerimónia de entrega dos cheques. "Já decidimos isso há bastante tempo, houve qualquer problema de comunicação", disse. Também rejeitou que a medida possa ter consequências graves, explicando que, "pelo contrário, nesta altura de crise, andar a distribuir, a oferecer dinheiro às pessoas" não lhe "parece bom".

"Nem tem ideia do que provocou", comentou Adalmiro Fonseca, da Associação Nacional de Directores de Escolas Públicas. Considera válida a decisão do ministério, de canalizar aquelas verbas para a compra de materiais ou para o desenvolvimento de projectos sociais nas escolas, dando aos alunos premiados a possibilidade de escolher a iniciativa a apoiar. "Mas isto só faria sentido se, com tempo, ganhássemos os alunos para a causa. Estabelecer a solidariedade por despacho não - assim, não se faz", diz.

Adalmiro Fonseca ainda não ganhara "coragem" para telefonar aos dois alunos da sua escola que há alguns dias convidou para irem receber os cheques de 500 euros, amanhã. A situação é especialmente grave, concorda Manuel Esperança, presidente do Conselho das Escolas, "quando os directores têm noção de que os alunos em causa têm dificuldades económicas". Ambos procuravam, já, mecenas que aceitassem substituir-se ao ministério no pagamento dos prémios. Manuel Pereira, da Associação Nacional de Dirigentes Escolares, disse conhecer colegas que já estavam a contactar empresas e autarquias. Adalmiro Fonseca falou de directores "dispostos a dar os 500 euros do próprio bolso, se não encontrarem alternativa".

"O ministério não nos respeitou, mas nós devemos respeitar os alunos", explica Manuel Esperança, que considera "inadmissível" não ter sido sequer informado da medida, apesar de ser "presidente de um órgão consultivo do ministério, criado pelo próprio ministério".

Um dos primeiros a saber da notícia foi Diogo Bhovan, que terminou um curso profissional de Engenharia Informática com média de 18, na Secundária Avelar Brotero, em Coimbra. Dirigiu-se ao director, para saber quando receberia o prémio e aquele pediu informações à Direcção Regional de Educação (DRE) do Centro, em meados do mês. "O dinheiro faz-me falta - terei de trabalhar mais do que contava para pagar as propinas, mas o que me indigna é que mudem as regras no fim do jogo", reagiu Diogo, caloiro de Engenharia Informática.

Eva Lacerda, por ter completado o secundário em Gaia, na área da DRE do Norte, só ontem recebeu o segundo telefonema do director. "Para dizer a verdade nem percebi o que ele me disse - estava a contar pagar as propinas com este dinheiro e pensei que a opção de doar o dinheiro à escola seria minha...", admitiu. Pedro Faustino, de Castelo Branco, caloiro de Medicina em Coimbra, pensou o mesmo. "Está aqui uma grande confusão, com a praxe, não percebi bem", justificou. Ambos acharam "razoável" que, não podendo ser para eles, o dinheiro seja aplicado em projectos sociais.

"Fiquei triste, era uma grande ajuda - as despesas na Faculdade de Ciências do desporto são imensas", comentou Liane Henriques, acabada de sair da secundária de Vila Nova de Poiares. A mãe é secretária na função pública, o pai é "bate-chapas" e "as propinas são caras", diz. Regina Leite, aluna de Felgueiras que entrou em Medicina no Porto, mostra-se conformada. Perdeu a mãe aos 12 anos e teve de crescer depressa para ajudar o pai a cuidar da casa e da irmã, que tinha seis anos. "Ainda assim, nunca tive de trabalhar fora de casa, por isso acredito que haja pessoas a precisar mais do que eu", disse, ao saber que não receberia o prémio.

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