Fundação de Serralves dispensa 18 colaboradores

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Os trabalhadores asseguram vários serviços de recepção NÉLSON GARRIDO

Serralves desafiou os trabalhadores a criar uma empresa, à qual a Fundação passaria a recorrer, mas a proposta foi recusada

A Fundação de Serralves dispensou 18 colaboradores que asseguravam as várias valências dos serviços de recepção aos visitantes, incluindo atendimento ao balcão, bilheteira, bengaleiros e telefonista. Os visados, que, segundo a directora de recursos humanos, Cristina Passos, serão "cerca de 15", receberam na semana passada uma carta da directora-geral, Odete Patrício, na qual esta os informava de que os respectivos "contratos de prestação de serviço" cessariam no próximo dia 12 de Abril.

O processo iniciou-se em meados de Janeiro, quando a Direcção-Geral convocou os recepcionistas para uma reunião, na qual lhes propôs que criassem uma empresa, cujos serviços a Fundação depois contrataria. Foi-lhes ainda sugerido que procurassem orientação junto da IN Serralves, a incubadora de indústrias criativas da Fundação.

Segundo um dos trabalhadores agora dispensados, os recepcionistas tentaram perceber em concreto o que os poderia esperar caso avançassem para a constituição de uma empresa, pedindo detalhes respeitantes a horários de trabalho e pagamentos, tendo-lhes sido respondido, segundo a mesma fonte, "que isso depois se veria". Acabaram por recusar unanimemente a proposta, embora a direcção os tenha avisado de que, caso não a aceitassem, a Fundação recorreria a uma empresa externa para assegurar os serviços de atendimento.

Serralves acabou por convidar uma ex-recepcionista, que vinha entretanto desempenhando outras funções, para constituir uma empresa, à qual a Fundação já adjudicou todos os serviços de recepção aos visitantes. Esta nova empresa terá já tentado contratar pelo menos um dos ex-recepcionistas, que recusou, já que lhe propuseram o salário mínimo, bastante abaixo dos cerca de mil euros que, em média, vinha ganhando por mês.

Várias associações de combate ao trabalho precário já manifestaram o seu repúdio por esta decisão. O grupo Ferve (Fartos/as d"Estes Recibos Verdes) considerou a proposta feita aos trabalhadores como uma forma de chantagem e classifica "o comportamento que a Fundação de Serralves tem vindo a assumir" como "alheado do cumprimento da lei e desprovido de moralidade, dignidade e respeito" para com pessoas que, em alguns casos, trabalham há mais de cinco anos na instituição.

Ainda segundo os responsáveis do grupo Ferve, a Fundação de Serralves "deveria ter celebrado contrato com estes trabalhadores", uma vez que, argumentam, trata-se de pessoas que "utilizam material disponibilizado pela entidade empregadora", vestem "farda da instituição", estão "inseridos numa equipa", "têm chefias" e estão na "dependência económica da entidade que as contrata".

A posição de Serralves é a de que se trata de genuínos contratos de prestação de serviço. A directora de recursos humanos classifica o conjunto dos recepcionistas como "uma bolsa de colaboradores" e acrescenta que a Fundação nunca atribui determinado turno a uma pessoa específica. "São eles", afirma, "que organizam as escalas de serviço, segundo as suas próprias disponibilidades", tendo apenas de garantir que há alguém destacado para cada uma das funções no horário de funcionamento da instituição.

Profissionalizar serviços

O ex-recepcionista com quem o PÚBLICO falou confirma este modelo de funcionamento, mas recorda que as escalas têm de ser comunicadas a uma coordenadora que integra o quadro de funcionários de Serralves, Alice Rorato, que as tem de aprovar e que pode impor alterações.

Segundo Cristina Passos, o que levou Serralves a tomar esta medida foi o desejo de "profissionalizar os serviços", uma vez que, argumenta, "o sistema de auto-organização destes colaboradores não se estava a revelar satisfatório". O assunto já foi comunicado à Autoridade para as Condições de Trabalho, que esteve em Serralves e procede, neste momento, à recolha de testemunhos. Alguns dos dispensados terão já também procurado aconselhamento jurídico e estarão a ponderar processar a Fundação.

Apesar de terem sido dispensados 18 colaboradores - aceitando o número que nos foi adiantado por um dos visados -, os postos de trabalho em causa são apenas cinco: dois de atendimento ao balcão, um nos bengaleiros, outro na central telefónica e um último na bilheteira exterior do Museu de Arte Contemporânea.

Se alguns destes 18 recepcionistas só trabalham ocasionalmente, ou, noutros casos, apenas aos fins-se-semana, há quatro que, além de terem a responsabilidade de concertar as escalas de serviço com as restantes, prestam regularmente serviço durante toda a semana e, em alguns casos, já o fazem há sete anos.

A nenhum dos trabalhadores dispensados foi oferecida qualquer indemnização. "Se o fizéssemos, estaríamos a admitir que tinham contrato de trabalho", justificou Cristina Passos.

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